João Correia
Na esfera pública, as escolhas implicam em renúncias tal como ocorre na vida privada. A diferença está no escopo das consequências, nas proporções e nas escalas. Uma atitude desastrada em âmbito individual normalmente tende a afetar o praticante e seu entorno, mas é bem mais limitada de que decisões escolhidas no terreno coletivo que costumam afetar muitas pessoas; os juristas usam a expressão latina “ erga omnes”, que significa “ para todos “. Por isso, as decisões públicas que afetam o coletivo devem ser bem discutidas, demandam debates qualificados, precisam passar pelo crivo de varias opiniões antes de serem implementadas.
Tais cuidados, infelizmente, parecem não ter sido observados com a decisão do Governo Gladson Cameli em formar um caixa em marcha forçada, bem radical, para reforçar o erário de seu Governo, usando a desocupação de milhares de cargos e funções de servidores públicos e patrocinando a paralisia de diversas atividades de Governo.
As consequências foram fortes e amargas, amaríssimas até, para os acreanos mais simples e vulneráveis, que, infelizmente, formam a maioria da população. Quais as principais consequências dessa situação? O velho e triste empobrecimento, o aumento do endividamento e da miséria de muitas famílias e pessoas neste começo de Governo, confirmando e amplificando a penúria cumulativa e sistemática imposta aos cidadãos pelos Governos do PT.
Imagine-se que o conceito macroeconômico do Produto Interno Bruto-PIB (soma monetária dos bens e serviços finais, gerados em determinado período de tempo) seja calculado por bimestre, o tempo de vida do atual Governo. Resta assentado de que nos últimos dois meses o PIB absoluto do Acre encolheu e o PIB por cabeça, é lógico, também diminuiu. A sociedade acreana empobreceu, muitas famílias acreanas entraram em ruína e os indivíduos têm, hoje, menor poder de compra do que detinham dois meses atrás.
Se o cálculo da riqueza for feito pelo lado da demanda agregada da economia (soma de todas as procuras por bens e serviços) então ficará assim: o PIB= Consumo+Investimento+Governo+ Exportação-Importação. Fixe-se, agora, o olhar apenas no Consumo e no Governo dessa equação. Se o Governo for forte como empregador, ou seja, se for poderosa a economia do contracheque, então será robusta a procura por bens e serviços no mercado a ser paga com os recursos dos salários. Se o setor privado também for exuberante, somado ao público, ter-se-á massa salarial amplificada e potencializada e o pleno emprego quedará à vista, no horizonte. A existência sistemática e regular desses recursos cria, reproduz e expande hábitos de consumo cada vez mais espraiados. O comércio, a prestação de serviços, produtos agrícolas e bens industriais locais são irrigadas com esses recursos preciosos ao funcionamento da economia.
Por aqui, sabe-se, o essencial da economia alicerça-se no contracheque.
Dentre os Estados do Brasil, pode-se dizer, sem medo de errar, de que a economia do Acre se não for medalha de ouro está no pódio das mais dependentes do tal olerite. As atividades econômicas germinativas com cadeias produtivas a montante e a jusante são inexistentes, exceto pela bovinocultura de corte e pela extração de madeira que apresentam certo grau tecnológico.
Se, por decisão do Governo Estadual, abruptamente, o valor total dos salários pagos pelo Estado encolheu para a metade (segundo consta, o Governador Gladson Cameli informou ao Ministro Paulo Guedes uma redução de 45% do valor total da folha de pagamento do pessoal do Governo do Estado) então o efeito em cascata na economia foi devastador. Alugueres não foram pagos, pão e o de comer não foram comprados, boletos não foram honrados, faltou dinheiro para o ônibus, contas de luz não foram liquidadas ou tiveram pagamentos adiados, peças de bicicletas não foram adquiridas, motocicletas ficaram sem gasolina, celulares não terão crédito, mototáxis, táxis e Uber foram dispensados, contas nas tabernas não foram saldadas ou foram adiadas etc etc etc.
A redução drástica de demanda pela quebra da massa salarial promovida pelo Governo do Acre teve efeitos multiplicadores negativos nos demais setores da economia local. Não precisa expertise em Economia para se saber que estabelecimentos comerciais e de serviços espalhados pelos quatro cantos do Estado murcharam ou ficaram entanguidos e de que atividades econômicas que decrescem desempregam trabalhadores e alimentam o círculo vicioso da miséria e da penúria.
Menciona-se, aqui, apenas um átimo da vida dos mais pobres porque são os que mais sofrem com a depauperação imposta; mas o efeito nocivo da ruína asperge-se sobre todos, sobre o conjunto da sociedade acreana.
De resto, não se pode olvidar uma certa falta de honorabilidade nessa forma de se conseguir superávit. Sabe-se do dever de se combater gorduras, desperdícios, malversações, otimizar investimentos, mostrar competência na busca de recursos, dentre outras atividades positivas; mas não dá para exibir entusiasmo na visão do ato de se tirar o pão da boca de pessoas que não podem se defender.
Outros componentes do quadro recessivo, efeitos psicológicos, mecanismos das expectativas, dentre outros, serão tratados no próximo texto. Desculpem o economês.
*João Correia é professor universitário e escreve no ac24horas às quintas
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