Roberto Feres
Alguém deu um desconto de 20% no IPTU de todos os imóveis de Rio Branco. Ainda não se sabe quem, quando, nem porquê. Se alguma boa alma descobrir como isso ocorreu, leve essa informação ao conhecimento dos gestores municipais. A prefeitura agradece.
Enquanto isso, os carnês do imposto foram impressos com um susto novo ao contribuinte, já atônito com os 20% a mais na conta de luz de janeiro, a economia local em recessão brava e o governo estadual devendo fornecedores, o 13º e contendo drasticamente os empregos terceirizados.
Acompanhei, na sexta passada, a audiência pública sobre o imbróglio do IPTU na Câmara Municipal, realizada por iniciativa do vereador Emerson Jarude e, faço questão de ressaltar, me impressionei bastante favoravelmente com a qualidade geral do evento e, em especial, de algumas falas.
A história, em suma, tem dois lados: contribuintes escorchados pelo excesso da carga tributária e município, que carrega o ônus da maior parcela de serviços diretos às pessoas, com o menor quinhão na divisão das receitas públicas.
Como contribuinte, não vejo o retorno do tanto que pago de impostos. Meu salário sai reduzido de uma bela garfada do Imposto de Renda. Tudo o que compro tem embutida outra garfada de ICMS, ISS, IPI etc. Se tenho um carrinho, lá vem o IPVA, Zona Azul, taxa sobre o combustível e daí por diante.
Por outro lado, a prefeitura se ressente de que a parte que lhe cabe do butim (os libertários têm quase que me convencido que imposto é mesmo roubo) é insuficiente para a manutenção da cidade e vive de chapéu na mão a esmolar transferências extras do governo federal.
Vou me abster neste artigo de advogar pelo contribuinte. Enquanto a discussão segue buscando formas de oficializar os tais 20%, seja pelo “direito adquirido”, descontos ou redução de alíquota, farei aqui um pouco do papel de advogado do diabo(nota).
Primeiramente, é importante frisar que estamos falando de um montante de recursos irrisórios no total de aproximadamente 830 milhões de reais anuais do orçamento de Rio Branco. Menos de 5% disso é lançado entre IPTU e taxa de lixo e, pior, menos da metade é efetivamente paga pela população. Deveriam ser esses os recursos para a prefeitura manter os serviços básicos, assim como é a taxa de condomínio dos prédios e loteamentos fechados.
A base de cálculo do IPTU é o valor da propriedade, isto é, quem tem imóveis mais caros deve pagar valores maiores, o que, a meu ver, parece absolutamente justo.
O gargalo para fazer o cálculo desse imposto é saber quanto vale, efetivamente, cada um dos imóveis para, daí, se calcular o que cada um deles deveria gerar de recursos para a prefeitura.
Para isso a legislação criou um artifício chamado de Mapa Genérico de Valores, que é produzido tecnicamente, usando modelos da Estatística, mostrando quanto vale um metro quadrado de terreno em cada porção da cidade. Avaliadores reúnem uma grande quantidade de dados referentes às transações imobiliárias recentes e calculam a média para cada bairro ou pequena região que tenha características comuns.
Mas há muitos fatores que interferem no preço de um terreno além de sua localização: Está regular, ou tem pendências na documentação do cartório e prefeitura? A venda foi financiada ou foi a vista? Está isolado ou em condomínio? O valor declarado era real ou simbólico? O certo é que são raríssimos os casos no Brasil que o valor venal de um terreno urbano, calculado pela multiplicação de sua área pelo preço de um metro quadrado indicado para sua localização no mapa de valores, fique próximo ao seu valor de mercado para venda a vista. Há casos onde não chega a meros 10% da realidade local.
Esse é um desafio a ser enfrentado pelo município. Entidades como o Ibape, que reúne os engenheiros e arquitetos que trabalham com avaliações, o CRECI, CREA, CAU, cartórios imobiliários têm muito a oferecer à prefeitura, que hoje em dia tem um cadastro imobiliário muito melhor organizado e informatizado que na época da última revisão do mapa de valores.
Associações de bairros, entidades empresariais e de classes e até mesmo os operadores do mercado imobiliário, que encabeçam a chiadeira atual pela descoberta do tal erro e repasse dos 20% ao IPTU de 2019 (cobertos de razões), serão também contrários a uma revisão técnica no Mapa. Recomendo que guardem parte da energia para questionarem os demais tributos e interferirem, com seu poder político, para uma redistribuição da receita que retire nossas cidades da eterna mendicância.
Advogado do diabo é uma expressão da Igreja Católica para designar aquele que tem por missão apresentar provas contrárias a um candidato a santo ou a Papa.
Roberto Feres escreve às terças.
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