Os bastidores da Superintendência da Polícia Federal do Acre, em Rio Branco, estão pegando fogo devido aos desdobramentos internos da Operação Ícaro, cuja sua primeira fase iniciou em agosto deste ano, e foi determinante para o afastamento do prefeito de Capixaba, Zé Augusto (Progressistas) do cargo após a investigação de desvios de recursos públicos do Ministério da Saúde (MS). Os desdobramentos da Ícaro trouxeram a tona novos fatos que efetivaram a realização de uma nova Operação na semana passada, a Sarcófago, que prendeu o prefeito de Senador Guiomard André Maia (PSD) e parte da sua equipe.
Deliberações a parte, um áudio de whatsapp atribuído ao delegado Eduardo Gomes, coordenador da Operação policial, ganhou as redes sociais nesta quarta-feira, 19, onde ele pedia para uma escrivão da polícia federal identificado como Alberto Grassioli falsificar sua assinatura para a continuação de uma interceptação telefônica, já que o prazo de monitoramento de um investigado estaria vencendo, e o desembargador relator do caso exigia uma assinatura como base protocolar da ação. O delegado e o escrivão foram representados na Corregedoria da PF para que os fatos fossem apurados.
Ao tomar conhecimento que o áudio em questão teria vazado em grupos de whatsapp Brasil a fora, o delegado Eduardo Gomes encaminhou relatório a Superintendência da PF e a Corregedoria com sua versão. “Para evitar que os fatos se alastrem e sejam feitas interpretações pejorativas e indevidas e que não espelhem a verdade dos fatos, tomo a iniciativa de apresentar os fatos e todo o diálogo travado por whatsapp que motivou esse embrólio, para que haja transparência e a devida apuração”, informa o delegado.
“No dia dos fatos, o prazo da interceptação esgotava-se e precisava ser renovado, sob pena de interrupção daquelas investigações. Este signatário alinhou com o Desembargador de Justiça responsável pelo caso que até o fim daquela tarde entregaria a respectiva representação policial pela prorrogação das interceptações, juntamente com os autos circunstanciados do período imediatamente anterior. Conforme alinhado com o NO/BAN, o auto circunstanciado foi finalizado e entregue por whatsapp a este signatário por volta das 14:30, do dia dos fatos (1º de novembro). De posse do documento, este signatário, mesmo em férias e sendo véspera de feriado, deslocou-se até a sede da superintendência de Polícia Federal em Santa Catarina e solicitou ao seu colega Delegado NAPP para utilizar o computador de sua sala para produzir a representação. Em Santa Catarina, devido à diferença de 2 (duas) horas do fuso horário, já era próximo das 18:00 horas, da véspera do feriado”, explica Eduardo.
Eduardo Gomes teria produzido a representação e a encaminhado por whatsapp ao escrivão Alberto Grassioli, juntamente com o auto circunstanciado, para que o documento fosse impresso, assinado por um delegado no Acre, novamente digitalizado, salvo em um CD/DVD e entregue mediante ofício ao Desembargador do caso, que aguardava somente por esse documento para decidir sobre o pedido e ir embora para aproveitar o feriado.
Segundo o delegado, o documento foi enviado ao referido escrivão às 16:14 (dezesseis horas e quatorze minutos daquele dia) – horário do Acre, sendo em Santa Catarina já 18:14 minutos. “Após cerca de 45 minutos (cerca de 17:05 horas), o referido escrivão responde por whatsapp informando que somente havia visto a situação naquele momento, solicitando outro colega para cumprir a ordem, pois estava cansado por ter saído de um flagrante que supostamente teria atravessado a madrugada”, revela Gomes.
O delegado teria argumentado que não havia ninguém para fazer o trabalho que cabia ao cartório da PF, até porque era véspera de feriado, bem como porque não estava no Acre e a incumbência, portanto, era do referido escrivão.
“Argumentei ainda que a situação não poderia esperar para o dia seguinte e que o Desembargador e sua assessora estavam aguardando somente pelo referido documento para apreciar o pedido e ir para casa”, disse.
A representação revela que após mais de uma hora de insistência, já sendo, no Acre, quase 19:00 da noite e, em Santa Catarina, quase 21:00, confirma que o delegado mudou o tom e disse que aquela incumbência era uma ordem que precisava ser impreterivelmente cumprida pelo referido escrivão, que deveria se dirigir até a SR/PF/AC, imprimir o documento, enquanto este signatário tentava contato com algum delegado que pudesse assiná-lo.
“Este signatário tentou contato com todos os delegados da casa que estavam no Acre e, por mais de uma hora, por já ter passado o horário de expediente, não conseguiu contato. Ao mesmo tempo, o referido escrivão estava reticente e dizia que não iria fazer o que lhe havia sido determinado, porque já havia terminado o expediente e estava jogando bola. Ao mesmo tempo, estava recebendo diversas ligações do gabinete do Desembargador e da assessora dele cobrando o documento”, revelou o delegado em documento.
Apesar de todo imbróglio, o delegado diz que a Justiça aceitou o documento que foi enviado via whatsapp para a assessora do Desembargador, sem ter sido assinado, tendo a própria assessora certificado que o recebeu, suprindo, inclusive, a falta de assinatura.
“No entanto, nesse interregno, no afã de resolver a situação, estando à distância e com pouco tempo, eis que a medida judicial se esgotava naquele dia e o Desembargador estava já irritado e cobrando o documento prometido, este signatário, de forma um tanto descuidada e até inadequada, porém, visando solucionar o problema que estava em suas mãos para resolver, num ato de quase desespero, às 21:00 horas da noite, da véspera de feriado, há cerca de 5.000 quilômetros de distância do Acre, usou a seguinte figura de linguagem para o referido servidor escrivão de Polícia Federal: “falsifica minha assinatura”, “dá um jeito”, ao mesmo tempo que implorava , chegando a dizer: “pelo amor de Deus”, “resolve isso”, “é você que precisa resolver isso”, escreve o delegado confirmando a veracidade do áudio, afirmando que o objetivo era ordenar que o escrivão voltasse ao local de serviço, até porque o documento lhe foi enviado durante o período de expediente (16:14 da tarde) para proceder conforme o procedimento estabelecido e requerido pela Justiça.
O delegado afirma ainda que jamais passou pela cabeça cometer qualquer crime de falsidade ideológica, até porque o documento seria revisado e ratificado. “A ideia também não era que o escrivão falsificasse o documento e assinasse em lugar deste signatário. Veja-se que no calor do momento, já os ânimos extremamente exaltados, tarde da noite e todos (escrivão e delegado) sob pressão, o recado que se quis passar ao escrivão foi: mexa-se! resolva esse problema da forma que for possível, pois o problema é nosso, é seu, a atribuição é sua e é preciso ser resolvido agora, impreterivelmente neste momento, há um Desembargador de Justiça confiando em nós e nos aguardando para ir para casa”, explicou o Eduardo que afirmou ainda que estava sendo responsável e querendo trabalhar, “por outro lado, o referido servidor estava se esquivando disso”, enfatizou.
Ainda na representação, o delegado revela que o escrivão chegou a comparecer à superintendência da PF e o Delegado Fares Fegali, que também compareceu à SR/PF/AC, conseguiu ser contatado para assinar o referido documento, “apesar de que, no final, essa assinatura foi dispensada pela Justiça que, num ato de confiança neste signatário, aceitou o documento encaminhado por whatsapp e sem assinatura”.
Eduardo relata a gravidade do escrivão vazar uma conversa sigilosa, mantida num ambiente de hierarquia funcional. “Faltou ao servidor responsabilidade e lealdade para com o serviço e respeito ao seus superior. Essa conversa tinha cunho profissional e sigiloso, não poderia ser vazada para terceiros, e muito menos exposta da forma como foi feita”, disse.
Em face de todo o exposto, o delegado entende também que não há mais como estabelecer uma relação de confiança pede a substituição do mesmo.
O ac24horas deixa o espaço aberto para que o escrivão e o delegado possam se manifestar, caso considerem importante.
Esse material foi produzido conjuntamente com o site Folha do Acre.
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