As novas relações trabalhistas que entraram em vigor no país com reformas aprovadas pelo atual governo, que permitem uma relação mais flexível entre patrão e empregado, podem contribuir para que as cooperativas de trabalho ganhe mais espaço no mercado.
Essa possível vantagem, contudo, não pode ocorrer em detrimento dos princípios e valores que norteiam o cooperativismo de trabalho, regido por legislação própria: a Lei 12.690. Essa é a avaliação do advogado Paulo Roberto Stöberl, ex-coordenador do Departamento Jurídico da Organização das Cooperativas do Estado do Paraná (Ocepar).
No fim de agosto ele esteve no Acre a convite do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop) para ministrar cursos às cooperativas de trabalho do estado. “A relação de trabalho nesse país é muito bem regulamentada, e as cooperativas de trabalho não querem mexer com isso”, afirma.
Leia a entrevista a seguir
As cooperativas de trabalho são o ramo do cooperativismo que mais enfrentam problemas com a Justiça. Fiscalizações do Ministério do Trabalho e Ministério Público do Trabalho acabam por levá-las para processos nos Tribunais do Trabalho. Por que isso ocorre?
Stöberl. Esse é um modelo que já teve de fato muitos problemas com estes órgãos porque, em dado momento, houve muitos problemas com as falsas cooperativas de trabalho. A gente não pode dizer que não ocorreram problemas. Mas a reação do Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e da própria Justiça do Trabalho em dado momento, de alguns componentes desses órgãos, foi no sentido de que as cooperativas de trabalho não poderiam existir. Desse embate entre o cooperativismo e esses órgãos surgiu a Lei 12.690, de 2012. Se você analisa todas as cooperativas você vê que as de trabalho possuem princípios e valores voltados à proteção do trabalho. Com isso, uma série de regras dentro dessa legislação molda essa sociedade de maneira tal que ela seja detentora de obrigações em relação a direitos do cooperado, para a proteção dessa figura de trabalhador.
O senhor avalia que as pessoas que se unem para criar uma cooperativa de trabalho têm o devido conhecimento jurídico sobre seu funcionamento?
Stöberl: Infelizmente, não. A necessidade da criação de uma cooperativa de trabalho é indiscutível. Num primeiro momento as pessoas ficam muito ávidas de ter esse encaminhamento desse trabalhador para um posto de trabalho. E são pessoas que têm, geralmente, um nível sociocultural não tão desenvolvido como em outros ramos [do cooperativismo]. Não estou fazendo juízo de valor. Elas precisam ter as mesmas condições de igualdade de conhecer a legislação. E acho essencial esse curso oferecido pelo Sescoop do Acre.
As novas regras que flexibilizaram a legislação trabalhista – como a terceirização – podem levar a um aumento na criação de cooperativas de trabalho?
Stöberl: Pode ser. Essa lei da terceirização possibilita ao empregador, a certa altura, se utilizar de outros instrumentos para aumentar o seu grupo de trabalhadores. Neste sentido, pode ser uma possibilidade de aumento e de nicho para as cooperativas de trabalho. Agora, isso tem que ser bem aproveitado no sentido de realmente não distorcer nenhuma dessas situações. A relação de trabalho nesse país é muito bem regulamentada, e as cooperativas de trabalho não querem mexer com isso. Os trabalhadores cooperados não são trabalhadores celetistas, muito pelo contrário. Existem diferenças, e essas relações não podem nunca ser misturadas.
Um trabalhador cooperado tem menos valor que um trabalhador CLT?
Stöberl: Não, muito pelo contrário. Um trabalhador cooperado tem que ter mais vantagens em estar na cooperativa do que fora. A cooperativa, nessa dimensão econômica e protetiva, tem que oferecer ao cooperado melhores condições. E ali há regras que a própria Lei 12.690 determina que a cooperativa chegue a uma prestação de serviço e de uma melhora das condições de trabalho desse cooperado.