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Agora é que são elas…

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Nasci no Nordeste, que não é lá esse exemplo de respeito a pauta feminina. Convivi muito próximo da minha família materna: patriarcal, tradicional e rígida. Cresci ouvindo do meu avô, na fazenda, que “homem da nossa família quebra, mas não se dobra para ninguém”; “homem da nossa família tem uma palavra só”; “homem tem que sustentar sua mulher e sua família, se você não pode fazer isso não arrume mulher e família”. Não me recordo de termos falado sobre o papel das mulheres. Não fosse a abordagem mais moderada do meu pai, talvez minha personalidade não encontrasse espaço para essas reflexões.



Era um homem extraordinário, nunca estive numa presença que impusesse tanto respeito. Seu sonho era ter um filho, teve cinco filhas. Deus não te dá o que você quer, mas o que você precisa. Foi agraciado com cinco mulheres fortes, respeitadas e bem-sucedidas. Primeiro neto da família, carrego orgulhosamente o seu nome, homenagem da minha mãe.


Já desencarnado, certamente um pouco mais desvencilhado dos (pré)conceitos daquela última personalidade, talvez o velho Edson Rigaud, consciente da graça que tinha recebido, lá do mundo espiritual tenha me dado uma mãozinha na concessão da minha benção, da minha graça, a Catharina.


Para um indivíduo com as minhas origens, ser pai de uma menina é uma experiência excepcional e desafiadora. Ver o mundo sob os olhos de uma menina é conhecer um mundo novo. Passados três anos, a cada dia fica mais fácil superar os condicionamentos mentais machistas. Ajuda chegar em casa e ter que brincar de casinha, ser maquiado, dançar (se atreva a negar e veja o resultado…) ao som da música da Frozen, da Moana e do filme Bailarina. Tema proibido apenas essa ideia absurda de namorar futuramente, é claro, evolução espiritual tem limite!


Nem tudo são flores, entretanto, e o artigo na verdade é sobre isso. Ser pai de uma menina desperta-nos para questões que, antes, sequer cogitávamos. Violência contra mulher, preconceito, oportunidades no mercado de trabalho, pressão social, assédio, custos do salão de beleza, …, a lista é grande e assusta.


Falo hoje sobre uma dessas questões: a injustificável disparidade da participação feminina na política.
Maioria da população, atualmente as mulheres representam apenas 10% dos Deputados na Câmara Federal. No Senado são 14,5%. Na Assembleia Legislativa do Estado do Acre são aproximadamente 16%. Na Câmara Municipal aproximadamente 12%.


Mesmo num Estado prodigioso em ter mulheres atuando com maestria em posições de destaque como, por exemplo, a Desembargadora Denise Bonfim no Tribunal de Justiça; Desembargadora Regina Ferrari, no TRE; Dra. Kátia Rejane como Procuradora Geral de Justiça; Dra. Socorro Neri, Prefeita de Rio Branco; Dra. Diana Calazans, Superintendente da Polícia Federal, dentre tantas outras, fato é que também aqui a representação política feminina está aquém do esperado.


As razões que explicam esse fenômeno certamente são variadas, mas parte delas decorrem das barreiras que as mulheres encontram nas próprias estruturas partidárias. Não obstante o artigo 10, § 3º da Lei 9.504/97 já lhes garantisse o direito de representar no mínimo 30% dos candidatos, fato é que esse requisito legal historicamente costumava ser burlado com o registro de candidaturas apenas para “cumprir tabela”. Já ouvi caso de candidata que nem sabia que era candidata, só se lembrou quando teve as contas de campanha rejeitadas pelo TRE e foi multada.


Apenas para ilustrar o cenário, basta dizer que o Partido da Mulher Brasileira – PMB foi punido ano passado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais por não respeitar, em suas inserções na televisão, o tempo mínimo obrigatório para promoção da participação da mulher na política. Brasil, o país da piada pronta.


Ocorre que o Tribunal Superior Eleitoral tomou decisão que pode começar a ajudar na mudança desse cenário. Semana passada a Corte, em decisão unânime, consolidou o entendimento de que pelo menos 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha seja destinado às candidaturas femininas, mesmo percentual que deve ser destinado a elas quanto ao tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e TV. Melhor, na hipótese de as candidaturas femininas superarem o mínimo de 30%, o repasse dos recursos do Fundo e a distribuição do tempo de propaganda devem ocorrer na mesma proporção.


Em outras palavras, estamos dizendo que pelo menos R$ 510 milhões de reais serão investidos em campanhas de mulheres agora em 2018. Elas terão dinheiro garantido e tempo para suas propagandas.


A decisão é histórica e muda a lógica que permitia as “candidatas laranja”. Os partidos agora serão obrigados a investir tempo e dinheiro nas suas candidaturas femininas – no mínimo 30% é delas e de mais ninguém -, razão pela qual não seria inteligente lançar candidatas que não possuam consistência e densidade.


Acredito que este novo paradigma propiciará o fortalecimento de valiosas lideranças femininas que estão despontando, robustecerá campanhas de nomes promissores como os de Temyllis Silva e Charlene Lima, bem como a consolidação de lideranças já estabelecidas como é o caso de Eliane Sinhasique, Jéssica Sales, Dra. Juliana, Leila Galvão, dentre tantas outras.


O jogo mudou, as condições estão mais parelhas. Agora é que são elas!


Edson Rigaud Viana Neto. Advogado. Procurador do Município de Rio Branco. Sócio do Escritório Khalil e Rigaud Advogados Associados. Membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político. Especialista em Direito do Estado pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito Tributário e Processo Tributário pelo Juspodvim. Ex-Conselheiro Regional da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Acre. Ex-Conselheiro da Associação Nacional.


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