Em entrevista exclusiva ao ac24horas, a governadora em exercício, Nazaré Araújo (PT), avaliou o processo político do Acre e do Brasil do momento. Ela se mostrou preocupada com o retrocesso democrático e a perda de direitos que o povo brasileiro vem sofrendo depois do impeachment da presidente Dilma (PT). Ressaltou a importância do movimento das mulheres e da conscientização dos eleitores para as suas escolhas nas próximas eleições. Quanto as candidaturas majoritárias já colocadas à sucessão do governador Tião Viana (PT), Nazaré considera apenas propostas enquanto as convenções partidárias não acontecerem.
ac24horas – Passado o processo no qual a senhora foi uma das indicadas para concorrer ao Governo. Em seguida o movimento das mulheres também reivindicavam uma candidatura sua ao Senado, mas não houve a sua indicação pela FPA. Como a senhora se sente?
Nazaré Araújo- Eu me sinto mais forte, mais madura. O processo das quatro pré-candidaturas nos permitiu conhecer um pouco mais o pensamento dos nossos companheiros Daniel Zen (PT), Emylson Farias(PDT) e Marcus Alexandre (PT). Foi um processo de troca em que a gente fez o debate dentro das regionais da FPA com muita participação popular. Eu também me comprometi ainda mais com o movimento das mulheres porque a gente vê que essa causa ainda precisa avançar dentro da sociedade. É preciso que as pessoas compreendam que isso não é capricho das mulheres, mas uma necessidade da humanidade. A questão do feminino tem sido desconsiderada no processo de desenvolvimento. Existe a necessidade de que haja o reconhecimento de igualdade entre os princípios masculinos e femininos para um equilíbrio. No Acre, temos 52% do eleitorado de mulheres, mas não existe o reconhecimento da sociedade da força da participação das mulheres. Quando o Tião Viana (PT) puxou a causa da minha candidatura a vice, em 2014, deu um grande espaço para a questão de gênero. Mas gente viu o que aconteceu com a presidente Dilma (PT) que foi chamada de vaca 600 mil vezes nas redes sociais. Então tem essa questão do ódio espalhado nas redes que afeta as mulheres. E a gente sente isso quando nos expomos no processo político. Ainda que as pessoas tenham muito respeito por mim, mas as mulheres ainda são avaliadas menos capazes. A “bela e recatada do lar” era uma coisa que aparecia muito forte em relação a mim como se fosse um aspecto negativo. Mas as mulheres que estão dentro do lar têm uma participação importante na nossa sociedade. O meu histórico profissional desapareceu pela condição de eu ser mulher. A política faz essa diferenciação muito forte entre homens e mulheres. Por isso é necessário uma luta nossa pela paridade da questão gênero e das formas políticas afirmativas.
ac24horas – Nesse processo de escolha ao Governo que a senhora participou em algum momento acreditou que poderia ser a escolhida? Ou tinha consciência que era um jogo de cartas marcadas?
NA – Sempre achei a minha candidatura muita séria ainda que por todas essas condições de gênero não tivesse o mesmo reconhecimento de trabalho e popularidade. Mas o debate e a exposição de ideias foi muito seria assim como acredito que tenha sido para os demais pré-candidatos. Levamos isso como um processo de conhecimento e de valorização da boa política, como um instrumento essencial da democracia. Porque se não é a política é a guerra e não podemos admitir a barbárie no Brasil. Precisa ter muito cuidado com algumas questões como o autoritarismo que aparece para como a salvação para uma parcela da população. A ciência da política é de como homens e mulheres que querem justiça social se organizam para tecer leis, organizações, orçamentos participativos e fazer a elevação da vivência em sociedade. Isso a gente valorou nesse processo das quatro candidaturas. Avançamos em questões importantes como a infraestrutura, segurança, fronteiras, narcotráfico e as ações preventivas da educação. Nós como agentes da cidadania temos que mostrar que é possível para a juventude mudanças. Fico preocupada quando leio em pesquisas que só 30% da população acredita na democracia.
ac24horas – Mas governadora como as pessoas vão acreditar na democracia se a gente sabe que a maioria dos mandatos atuais foram conquistados através de recursos advindos da corrupção? Algumas pessoas do Legislativo e do Executivo chegaram a esses mandatos comprando essa representatividade?
NA- Precisamos ir além da democracia representativa através da democracia participativa. A gente como cidadão que vota tem que ter o cuidado de votar naquelas pessoas que não estão a serviço de grupos. Eu concordo com você. Tem estudos que demonstram que muitos grupos fizeram compras de votos com valores elevados dentro do Congresso Nacional. O ano de 2018 será importante para a população brasileira acordar. Será um reinício do processo de democratização. Vivemos de 88 até a saída da presidente Dilma um longo tempo de valoração democrática. A nossa Constituição cidadã garantiu o acesso a direitos fundamentais. A democracia participativa é um cidadão participando daquilo que está acontecendo e firmando o compromisso de acompanhar os seus representantes escolhidos. E, na realidade, a maioria dos votantes, depois de um ano, não lembra mais em que votou. Então não há como acompanhar o trabalho dos escolhidos. Fico feliz com o movimento que o TSE fez de mais mulheres na política. Tem os parlamentares escolhidos dentro das escolas para a juventude participar do processo democrático se comprometendo com os mandatos juvenis. Esse é um exercício e não podemos nos furtar de fazer essa valorização da democracia. Ainda que muitos digam que não é o regime ideal, ainda que digam que não temos uma República Federativa. Mas assisti aos estados se ajudando quando o Tião Viana puxou aquela reunião com os governadores para debater a questão da segurança e controle de fronteiras. Tinham quatro ministros e quase todos os governadores. Isso é construção de uma República Federativa e de democracia, não aquilo que vem de cima pra baixo. O movimento autoritário e os salvadores da pátria surgem do ódio colocado que destrói a construção coletiva para jogar tudo na mão de uma pessoa só, o salvador da pátria. Isso pode nos levar a momentos muito tristes que já vivenciamos anteriormente e que ninguém quer de volta.
ac24horas – Dentro dessa análise a gente sabe que o seu grupo político, a FPA, não colocou nenhuma mulher em candidaturas majoritárias a serem disputadas em 2018. Como a senhora avalia isso?
NA – Tudo ainda tem que passar pelo crivo das convenções partidárias. Até que venham as convenções todas essas candidaturas colocadas são apenas propostas. Não existe uma candidatura posta efetivamente e conclusivamente. Isso não existe. Mas de toda maneira na construção com os partidos fiquei como suplente do senador Jorge Viana (PT). As suplências devem ter papéis diferentes na construção de mandatos. E é a isso que eu me disponho. Creio que tenho condições de fazer essa representação das mulheres e o Jorge já demonstrou o compromisso que tem com essa causa. Por exemplo, quando defende uma alteração para que o crime de estupro seja considerado inafiançável.
ac24horas – A senhora então pretende participar efetivamente do mandato se o senador Jorge Viana for reeleito?
NA – Sim. Hoje conversava com ele sobre as minhas ideias. Eu resido em Rio Branco e pretendo construir seminários para debater com os movimentos sociais a conscientização das pessoas. Então considero que na chapa majoritária estão mulheres que fazem também acontecer as candidaturas. Eu e a Márcia Regina, (PSB) que será suplente do Ney Amorim (PT), temos uma experiência dentro do Governo que nos permite fazer defesa de projetos. Ainda temos muito para andar e muito para manter. A Reforma Trabalhista mostrou o quanto foi rápido para destruir uma construção de 50 anos. Agora, na Reforma da Previdência, temos regiões no Brasil em que a média que está prevista para a pessoa se aposentar é maior do que a expectativa de vida. É preciso que a gente lembre as pessoas. Porque ao colonialismo para o qual estamos voltando o trabalho é um coisa que vale menos. Um trabalhador é menor. Isso precisa ser revisto porque é a lei da selva.
ac24horas – Governadora a senhora falou com razão que não existe nada definido enquanto não acontecerem as convenções partidárias. Como filha do primeiro governador do Acre, José Augusto, depois dessa experiência como vice-governadora e com essa visão ampla da sua profissão de procuradora. Dentro do que está colocado no tabuleiro das três candidaturas do Marcus, Gladson e Coronel Ulysses, os três têm mais ou menos com a mesma idade e perfis conservadores, qual a visão que a senhora tem do futuro do Acre a partir do próximo governo?
NA – Penso que deixamos linhas muito claras para o futuro do Acre. O mundo precisa valorizar a questão ambiental. Nós mostramos que é possível ter um arranjo de serviço ambiental dentro da floresta que precisa avançar como modelo de desenvolvimento. A pessoa que está dentro da floresta precisa ter as mesmas oportunidades nas questões energéticas, educacionais e de saúde. Durante o nosso governo enfrentamos muitas crises. Pontuou e fez a diferença o conhecimento do Tião Viana que esteve durante 12 anos no Senado. Mas enfrentamos muitas crises éticas, políticas, até com um impeachment, econômica e financeira. Nós enfrentamos a questão do Rio Madeira, a maior alagação que esse Estado já viu, em Rio Branco, em 2015, e a questão do tráfico que gerou toda essa violência. As crises locais e nacionais se somaram. Hoje a gente vê estados grandes como o Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro parcelando salários. O norte para essas pessoas que querem o governo é o desenvolvimento sustentável. A Amazônia é sagrada para o mundo inteiro, mas quem vive aqui precisa ter uma garantia de investimento. Seja através de um ICMS Verde ou um processo energético diferenciado. É preciso investir nas comunidades, como fizemos com 90% dos recursos da KFW, que ainda necessitam de muitos acompanhamentos. Dentro das áreas degradas fizemos a lição de casa com o aproveitamento dessas terras e impedimos o desmatamento. Eu torço que quem ganhar continue o projeto que a FPA aponta e vou lutar por isso. Mas qualquer um deles deve seguir o caminho para o aproveitamento da nossa diversidade olhando as regiões do Pacífico e dos Andes como um fator de grande desenvolvimento.
ac24horas – Recentemente o site G1 fez uma avaliação de todos os governos dos estados brasileiros e colocou o Acre em último lugar. Isso foi causado por essas crises as quais a senhora se referiu?
NA – Avalio isso como algo muito injusto e parcial. Porque considerou alguns itens e não outros. Vejo que a avaliação do G1 deixou de considerar muitas coisas. Tenho receio que a cristalização de alguns órgãos da imprensa tornem parciais essas avaliações. Como que pode o Governo do Acre que está mantendo uma série de serviços ser pior avaliado do que outros estados que já fecharam os seus atendimentos em UPAs? Aqui estão todas abertas e funcionando. Como que pode se estamos com os salários e décimo terceiro em dia sermos pior avaliados que o Rio Grande do Sul ou o Rio de Janeiro que atrasam os salários do funcionalismo? Aqui não tem uma crise entre as policias como no Rio Grande do Norte. Isso me parece bastante parcial.
ac24horas – Qual o seu futuro político? Será mesmo suplente ao Senado? Ainda que alguns especulem sobre uma possível candidatura sua a deputada federal? Ou mesmo uma reviravolta nas candidaturas majoritárias?
NA – Eu nasci na política. Quando eu nasci meu pai já estava cassado e a minha mãe grávida de mim mandou uma carta para o povo do Acre sobre a condição que ele estava enfrentando e se elegeu deputada federal sem vir aqui. Passei 15 anos da minha vida esperando o retorno ao Acre porque a minha mãe também foi cassada pelo AI5. Ela é a grande inspiração da minha vida na política. Sempre atuou pelo ideal de ajudar o desenvolvimento social do Acre. Eu sou filha do José Augusto que implantou o método Paulo Freire, que queria educação para os seringueiros. Então ver um programa como Quero Ler acontecer com o Tião governador e eu vice é uma emoção sem limite porque está acontecendo aquilo que meu pai queria. Quando eu vou num ramal e a gente faz entrega de sementes de milho pras pessoas que foram expulsas de uma faixa de fronteira, me emociono. Quando a gente vai dentro de um Instituto Sócio-Educativo e através da música leva o sonho e a esperança como uma nova forma de conexão ao mundo, me emociono. A política partidária me dá condições de fazer a boa política pública. Mas com ou sem mandato o meu compromisso é de amor com o Estado do Acre e com a minha origem.
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