Estive almoçando no Mercado Velho com o senador Jorge Viana (PT) para entrevista-lo sobre os mais recentes acontecimentos políticos nacionais e as próximas eleições acreanas. No caminho do seu Gabinete até o Mercado, Jorge foi parado dezenas de vezes para fazer selfies com eleitores. Ele tem ainda uma imagem positiva junto à população, acredito, que referente ao tempo em que governou o Acre.
Numa das pensões onde almoçamos a entrevista foi interrompida várias vezes por fãs que pediam para tirar fotos ou o alertavam para alguma situação social. Apesar do desgaste do PT nos últimos anos, parece que Jorge conseguiu construir uma marca pessoal, em Rio Branco, que está além da questão partidária.
ac24horas – Senador o movimento que o país está vivendo de confronto político está se refletindo num comportamento agressivo entre as pessoas nas redes sociais. Como o senhor analisa esse momento do Brasil?
Jorge Viana – Fico também me perguntando por que estamos vivendo um momento tão difícil. Estávamos experimentando no Brasil um período de prosperidade, de inclusão social, de crescimento econômico. Por mais que alguns não gostem ou não queiram reconhecer, mas o fato concreto é que nos governos do presidente Lula (PT) e no primeiro mandato da presidente Dilma (PT), o Brasil viveu um período de prosperidade. Ao invés de consertar o que estava errado, de fazer o combate à corrupção e outras mazelas, resolveram destruir tudo. Acho que por pura intolerância e uma ação odiosa. Será que isso é por estarmos ainda numa virada de século e de milênio? Porque vejo isso no mundo inteiro. Observe o presidente dos Estados Unidos, uma pessoa que prega o ódio. Na Europa, os partidos que defendem os fundamentos nazistas estão ganhando espaços políticos. Estamos vivendo uma onda conservadora, atrasada, de intolerância e de preconceito. Eu sei que um dia vai passar, mas tomará que passe logo. Mas cada um de nós precisa fazer algo. Não adianta ficar esperando por governos e muito menos que o Judiciário ou os militares resolvam. O Brasil e o mundo estão precisando daquilo que temos de melhor e muita gente está oferecendo o que tem de pior.
JV – Nós temos problemas com governos de esquerda no mundo inteiro. Eu prefiro começar reconhecendo o quanto de bom que nós fizemos. O Lula é uma personalidade mundial, reconhecido pelo o mais rico empresário brasileiro e amado pelo mais pobre cidadão. Passou oito anos no Governo e não foi acusado de nada. Ele deixou um legado que se compara ao de Getúlio Vargas ou de Juscelino Kubistchek. Veja a perseguição que o Lula sofre atualmente. A Dilma fez um bom primeiro mandato, mas não consigo justificar porque a indicaram para continuar no segundo. Então nós temos um trabalho muito bonito, mas também erros de não termos feito os ajustes no aspecto político. Tivemos uma certa soberba, o famoso sapato alto. Teríamos que ter percebido que depois de muito tempo no governo era preciso promover mudanças para seguir governando. Mas nada justifica essa ação de ódio, de perseguição e de injustiça que a gente vive. Nunca o Brasil viveu tanto injustiça como agora. Alguns acham que estamos vivendo um momento de Justiça, eu discordo, pode ser de “justiçamento”. Parece com a época do Coliseu em Roma. Sempre alguém querendo mais sangue e cabeças rolando todos os dias. Nunca vi uma sociedade prosperar assim. As pessoas apostando nas desgraças dos outros. Isso não tem nada a ver com impunidade. O Brasil precisa de fato mudar de nível na política e na questão da corrupção, seja do ponto de vista empresarial ou da vida pública.
ac24horas – O senhor conviveu com dois personagens que foram manchetes nesse dias na imprensa. Por um lado, o ex-presidente Lula e, por outro, os ex-ministro petista Antônio Palocci. Como o senhor avaliou a delação do Palocci com ataques ao Lula?
JV – Fiquei chocado com as declarações do ministro Palocci, porque sempre o respeitei. Mas existem duas coisas preciosas na nossa existência. Uma é a vida e a outra a liberdade. Qual é a reação de alguém que se sente perseguido, preso por anos sem julgamento? Qual a reação de uma pessoa dessas? Dizem que uma pessoa assim faz qualquer coisa. Eu prefiro compreender situações como essas pelo lado humano e da privação da liberdade. Por que só estão presos os ex-tesoureiros e ex-ministros do PT? Não tem um tesoureiro do PMDB e do PSDB presos. E estão dizendo que fazem Justiça? Não pode ter ninguém acima da lei, mas também não pode ter ninguém abaixo dela. É um absurdo. Eu acho que o momento que vivemos estimula as organizações criminosas bem articuladas que estão crescendo. Por outro lado, temos figuras radicais que são intolerantes às minorias, às opções religiosas e sexuais das pessoas. É um período de trevas que estamos vivendo. A sociedade tem exemplos disso no passado. Impérios caíram por conta disso. Toda hora me pergunto se estou do lado certo da história para não ir na onda desse falso senso comum que se apresenta nas redes sociais. É muito perigoso esse efeito manada de todo mundo indo para um lado e achando coisas sem fundamentos. O pior de tudo é quando vejo gente do Judiciário extrapolando os seus limites funcionais porque é a maioria da população que sofre com isso. A classe política precisa assumir a sua responsabilidade e deveria fazer um pedido de desculpas coletivo. Não é só do PT, mas todos nós da política. Não podemos mudar o pra trás, mas podemos mudar as coisas daqui pra frente. Assumir que fomos responsáveis também por essa anarquia, por mais coisas boas que tenhamos feito. Tenho muito orgulho de tudo que fiz pelo Acre que continuou com o Binho (PT), o Tião (PT), o Marcus Alexandre (PT), o Angelim (PT). Erramos, mas tivemos muito mais acertos. Mas o caos está instalado. E o pior é que a ficha não caiu. Tem gente trabalhando pra fazer uma campanha eleitoral igual as outras e seguir com essa mesma política que nos arrastou ao caos sem entender que o mundo mudou e a sociedade exige uma mudança de comportamento. Precisamos voltar a ter a confiança da população.
ac24horas – A presidente do Supremo ministra Carmen Lúcia indagada sobre uma polêmica que o senhor participou sobre o afastamento do mandato do senador Aécio Neves (PSDB) disse, “estamos numa boa” sobre um possível conflito entre o Legislativo e o Judiciário. O quê significa essa frase senador?
JV – Acho que ela está tentando acalmar um pouco. Mas o ministro Marco Aurélio diz que estamos vivendo uma grave crise institucional. Eu concordo com ele. No caso do senador Aécio, o PT emitiu uma nota certa fazendo uma dura crítica a ele como o maior algoz da democracia e do impeachment junto com o Eduardo Cunha (PMDB). Ele poderia perder o mandato pelas evidências. Mas a gente não pode se arvorar em ser juiz. Por isso, que sou contra esses líderes do falso moralismo. O Aécio sempre teve o discurso da ética e da moralidade, e olha lá, foi pego junto com o Joesley. Agora, o Aécio precisa de uma ação da Justiça e do Senado. Mas isso não nos dá o direito de ver a nossa Constituição sendo rasgada para poder afastá-lo do mandato. É uma situação difícil pra nós.
ac24horas – Seria um justiçamento como o senhor falou há pouco?
JV – Eu peço a compreensão das pessoas. Fui eleito senador e sei que a Constituição está sendo desrespeitada também para o cidadão comum. Eu sei que a Constituição foi rasgada no impeachment e no caso do Lula. Mas nunca concordei com essa história de olho por olho. Tem um ditado que diz que na terra de cego quem tem um olho é rei, mas estou pensando que na terra de cego quem tem um olho pode perde-lo. Não podemos viver assim. No caso do Aécio o erro foi do Supremo que tem que reconhecer. Levar isso ao Pleno e aí assim cassar o seu mandato ou fazer o que manda a Constituição de enviar para o Senado. Aí eu vou estar lá como fizemos com o Delcídio. Fui um dos que 13 que sofri muitas incompreensões quando votei contra o pedido que veio do Supremo porque ofendia a Constituição. Mas quando chegou no Conselho de Ética e no plenário votei pela cassação dele. Temos que fazer as coisas direito. Não importa se é o Aécio, se é o Chico ou o Francisco. O que vale pro Chico tem que valer pro Francisco. Agora, não quero tripudiar, mas acho que o senador Aécio foi quem puxou esse ambiente de intolerância. Ele agredia o PT dizendo que era uma organização criminosa. E olha no que ele se transformou? Esse negócio de ficar apontando o dedo pros outros sendo acusador de todo mundo, tem sempre três dedos apontando pra gente de volta.
ac24horas – Vindo aqui pro Acre senador. Como o senhor está avaliando a sucessão do governador Tião Viana (PT) que, aparentemente, têm dois nomes colocados, do prefeito Marcus Alexandre (PT) e do senador Gladson Cameli (PP)? O senhor acha que mesmo com o desgaste de 20 anos da FPA no poder vocês têm chance de ganhar a eleição?
JV – Acredito que sim. Até alguns meses atrás o desgaste era só do PT. Mas veja o que está acontecendo com o Temer (PMDB), que foi presidente 15 anos do PMDB. Nunca tivemos um presidente da República tão impopular. Veja o que está acontecendo com o Aécio, que é um líder dos partidos de oposição aqui pra nós no Acre. Esses são os dois mais importantes partidos de oposição aqui no Acre. É o PMDB e o PSDB que a gente quer governando aqui no Acre nesse mesmo modelo que está governando o Brasil hoje? A resposta da população deve vir imediata: “não quero isso não”. O senador Gladson representa o Aécio e o Temer. O Marcus Alexandre representa o trabalho que fizemos aqui. Tem outros no nosso processo interno que vamos fechar em outubro, mas a grande possibilidade é o Marcus. Passou a ser uma necessidade termos a continuidade desse trabalho. O nome do Marcus Alexandre é o mais completo que temos para um momento como esse. Um gestor dedicado que conhece o Acre na palma da mão e está fazendo um trabalho extraordinário como prefeito de Rio Branco. O Acre não pode encarar uma aventura de ter um agrupamento de partidos que não confiam uns os outros, brigando que nem cão e gato, que é a nossa oposição. Eles não se entendem e sempre acham que já ganharam a eleição. Brigam pelos cargos antes da campanha. Mas isso é problema deles. Para vencer um período de crise temos que ter um governo responsável e bem focado. O perfil do Marcus Alexandre se adequa bem a esse momento. E falo com a experiência de ter sido prefeito e governador do Estado.
ac24horas – Como o senhor entende o processo eleitoral do Senado? Por que o senhor quer ser senador novamente pelo Acre?
JV – Nós vamos definir isso tudo até outubro. Acho um pouco cedo, mas entramos no processo e foi tudo muito coletivo com as plenárias no interior. Sou proibido de disputar qualquer cargo por conta do parentesco com o Tião. Só posso concorrer à reeleição. Estou no Senado fazendo meu trabalho e tenho sido reconhecido. Confesso que não tenho maiores ambições, mas compromisso de servir ao Acre e ao Brasil. Estou experimentando um momento que vai exigir novas atitudes de todos nós e quero ser parte dessa mudança. A gente precisa parar de se envergonhar da política pra gente voltar a se orgulhar. Quando comecei na política a gente se emocionava, sonhava e se orgulhava. Veja quantas coisas fizemos fruto de muito trabalho e dedicação. Queremos voltar aos tempos em que a população se sentia representada e se via na gente. Isso é maior motivação pra minha candidatura.
ac24horas – Na oposição, qual dos candidatos ao Senado o senhor acha mais forte?
JV – Eu não posso deixar de respeitar o trabalho que o senador Sérgio Petecão (PSD) faz. Ele foi muito bem votado na outra eleição. Mas cada disputa é diferente da outra. Eu estou com os pés no chão. Claro que ter sido prefeito e governador e trabalhado bastante ajuda muito. Mas acho que temos que construir uma plataforma para sermos votados pelo que podemos fazer daqui pra frente. Na oposição, do mesmo jeito que estão com uma soberba para o Governo, também tem uma briga para o Senado e aí podem quebrar a cara de novo porque quem decide é a população. Esse movimento que o Márcio Bittar (PMDB) fez junto ao PMDB mirou mais o Petecão do que nós da FPA. Mas isso é um problema deles.
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