Bom dia, boa tarde, boa noite, leitor!
Tenha paciência, mas a coluna hoje não foi escrita por mim. É uma transcrição que peguei no blog Inconsciente Coletivo – Vozes do Nosso Tempo -, do Estadão, com a fala do escritor israelense Amós Oz no evento de lançamento do seu livro mais recente, “Mais de uma luz – fanatismo, fé e conveniência no século XXI”. Evento este realizado no último dia 24 em São Paulo. Ele é um dos fundadores do movimento pacifista israelense Shalom Achshav (Paz Agora).
O tema me é caro. Como caro deve ser a todos nós. A fala de Amós Oz é instigante. Em alguns momentos nos cala, noutros nos faz querer gritar. É verdadeira e, por isso, um pouco densa, questionadora e até polêmica, mas necessária.
Não preciso dizer que já fiz a minha compra antecipada do livro, que será traduzido para 25 idiomas e está sendo lançado primeiro no Brasil. Porque, pra mim, é dessas leituras obrigatórias. Seus ensaios sempre me trazem boas reflexões. Creio que não será diferente agora.
Abaixo a transcrição da fala de Amós Oz em São Paulo:
É maravilhoso estar aqui. Este é o lugar certo para começarmos uma revolução ou pelo menos como alguém me falou, o lugar certo para planejar. Porque, como sabemos, é mais “divertido” planejar do que realizar.
Venho de um país problemático e cheguei a outro país problemático. Quando me pergunto a razão para o fato do mundo estar cada vez mais nebuloso e escuro, penso que esquecemos dos horrores do século passado e das guerras, o que dirá nossos filhos e netos.
Acho que Hitler e Stalin deixaram pras gerações futuras um presente maravilhoso. Com eles aprendemos a ter medo do fanatismo, medo de aplicar o ódio, medo das restrições. Este é um presente que Hitler e Stalin nos deram embora nunca quisessem isso.
Só que a data de vencimento deste presente está expirando, hoje não se tem medo de ser fanático, ninguém tem vergonha de ser racista, de manifestar o ódio, que aparece de diferentes maneiras no mundo.
Samuel Huntigton previu que no século 21 haveria um choque de civilização, entre Oriente e Ocidente, entre fanáticos religiosos e a democracia. Isso foi simplicado. Falava-se de sua mensagem como se fosse um filme de Hollywood, dos bonzinhos contra os maus, nesse caso com o Ocidente ocupando o lugar de bonzinho.
Não, senhores e senhoras, a batalha é dos fanáticos contra nós, e o fanatismo se manifesta de várias cores e formas.
Há islâmicos violentos e fanáticos, mas há também fanáticos que são contra islâmicos, assim como há judeus chauvinistas ou, em outro extremo, um fanatismo radical revolucionário.
Diante de certas pessoas por exemplo, se você acende um cigarro perto delas, você perde a vida. Conheço vegetarianos que te comerão vivo se você comer carne (risos da plateia). Vejo isso entre jovens idealistas, e até entre pessoas que pensam parecido comigo exceto pelo fato de que sou muito mais cético e cauteloso.
Eu conheço o remédio contra o fanatismo, e este remédio é o senso de humor. Já vi muito fanático com sarcasmo, mas nunca vi um fanático com o senso de humor direcionado a si mesmo. Nunca vi um fanático com aquele senso de humor tipicamente judaico.
O humor oferece imunidade maravilhosa contra o fanatismo. Se o senso de humor fosse vendido em cápsulas, eu proporia uma imunidade massiva contra esta praga dos nossos dias que é o fanatismo. E assim quem sabe eu concorreria não ao Nobel de Literatura, mas de Medicina.
Os fanáticos em geral se apresentam como grandes altruístas, eles querem te mudar para seu próprio bem, te curar de suas “ideias perigosas”, querem controlar seu hábito de votar sob a escusa de que é para seu próprio bem. Eles estão mais interessados em você do que você mesmo.
A Al Qaeda te mata para seu próprio bem, porque eles acham que você cultiva pecados mortais como a vaidade sexual ou hedonismos. Consideram que às vezes uma pequena dose de violência é necessária para que as pessoas despertem, para que salvem sua alma. Esta é a mente do fanático, ele é o pai e você é a criança que precisa ser resgatada.
Vi isso de perto pois quando eu era criança, eu era fanático. Em um romance recente, escrevo sobre pessoas que fortemente acreditam no que não acredito – elas acreditam no amor universal. Eu não acho que todos podem amar todos, para mim isso é slogan, somos capazes de amar umas 40 ou 50 pessoas no máximo. O amor universal é uma ideia sentimentalista e perigosa, porque quando o fanático descobre que não é possível ser amado, ele pode te matar.
O fanático te ama e quer te mudar, e se você se provar irredutível, ele vai cortar sua garganta. Sejamos cautelosos, quando falarmos sobre a política, sobre a necessidade de lutar pelos nossos valores, pela paz, pelo pluralismo, justiça social, vamos nos lembrar que nossa própria batalha não está imune ao fanatismo.
Tenho amigos pacifistas que poderiam me dar um tiro na cabeça porque penso uma estratégia diferente da deles com relação à Palestina, por exemplo.
Ninguém é imune ao próprio fanatismo, nem mesmo eu. Seria bom observar nossas famílias em primeiro lugar, será que às vezes não torcemos o braço deles achando que é pelo bem deles? Porque nós queremos salvá-los deles mesmos, supostamente, e esta ideia é um perigo.
É legítimo eu tentar mudar a mente de muitas pessoas à minha volta, ou mesmo os sentimentos de mulheres que não gostavam de mim (risos da plateia, pausa). Mas colocar pressão física ou emocional, é algo inadmissível.
Escrevi sobre Jesus em um dos meus romances, ele acredita no amor universal. Eu não, eu acredito em coexistência pragmática, em soluções que são temporárias e imperfeitas por natureza.
Quando escuto palavras como “nunca”, “sempre”, eu me fecho porque sei que essas palavras potencialmente contêm um germe mortífero. A violência não se dá apenas no plano físico com guerras e atentados, mas também através de pequenas agressões verbais do cotidiano.
Agora vou falar sobre meu continente, as notícias sobre Israel. Não sobre assentamentos, mais radicalismo, atentados e pessimismos. Isso também é notícia, claro. Mas deixe-me dar as boas novas que você nunca escuta ou assiste na mídia, porque estas não são notícias, não rendem manchetes. São processos em evolução.
80% dos judeus nunca pisaram em Gaza, eles não têm nenhum relacionamento emocional com esta terra, muitos deles apenas defendem sua ocupação porque se sentem inseguros. Isso é questionável e tem que ser discutido. Mas o ponto central é que os israelenses não nutrem fanatismo sobre esta terra.
E a maioria dos árabes e palestinos não são pró-Hammas, eles se sentem oprimidos e humilhados sob a ocupação.
Portanto a maior parte da população percebe que nesta casa precisarão viver duas famílias, como vizinhos. Não há outra solução. Não é o ideal, não é o paraíso. Antes de mais nada precisamos nos tornar bons vizinho de porta, para podermos nos falar “bom dia” no hall de entrada. Sermos gentis. Depois, convidar para tomar café e contar piadas sobre o passado estúpido. Jantar juntos, quem sabe estabelecendo laços de cooperação, que se projetariam sobre nossas economias.
Vamos ser pragmáticos como o são os médicos de família. Não há solução milagrosa. Curar o ferimento é a solução imediata, que na prática significa a criação de dois Estados.
Sobre minha escrita, quando quero expressar sobre o judaísmo enquanto concepção cultural e não apenas como religião e nacionalismo, quando eu quero misturar visão e pragmatismo, eu não escrevo romance, eu escrevo ensaio. E o Brasil é o primeiro país fora de Israel a publicar este ensaio, tenho o orgulho de dizer.
E quando escrevo uma novela, não se trata de uma afirmação. Meu desejo nesse caso é evocar a sua curiosidade sobre como seria ser outra pessoa na pele e usando seus sapatos, o que acho que tem um certo valor moral.
Pois você não consegue mudar nada no mundo a menos que tenha curiosidade intelectual.
É preciso estimular o lado interno das pessoas. Acho que a pessoa curiosa é melhor que a pessoa não curiosa, acredito que uma pessoa curiosa é até melhor motorista, na medida em que ela se pergunta se o motorista que está à frente pode mudar de faixa. Desconfio que os curiosos são melhores amantes também (risos).
Muito obrigado pela sua curiosidade, atenção e senso de humor.
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