Transcrito do Jornal OPINIÃO
Rio Branco – Acre
Estão ficando cada vez mais conhecidas as missas onde multidões rezam, cantam e choram guiadas por padres carismáticos – símbolo que atrai milhares de fiéis enquanto a igreja “tradicional” os perde.
Na capital acreana, o Padre James, da paróquia São Francisco de Assis; e o Frei Renã, da São Peregrino; ambos carismáticos, têm conquistado o coração de pessoas que há anos não participavam das celebrações da igreja católica. “É uma missa moderna, animada. Há 10 anos que eu tinha deixado de ir à igreja porque ficava entediado. Mas, aqui é diferente. Senti-me tocado por Deus”, afirma Roberto Murad, 40 anos, que passou a ser presença garantida nas missas dominicais, às 8h, na São Peregrino.
Sorridentes, ativos e acompanhados por ministérios de música, com microfone nas mãos, os párocos começam as celebrações cantando e agitando os fiéis.
“Nada poderá me abalar. Nada poderá me derrotar. Pois minha força e vitória tem um nome é Jesus”, clama no altar o Frei Renã e a igreja vem abaixo com a emoção dos fiéis.
“O Frei Renã é um homem carismático, humilde. Se você vem uma vez para cá, não deixa de vir nunca mais”, afirma Juliana Gusmão – que frequenta as missas de restauração das famílias – realizadas nas primeiras quintas-feiras do mês – e as celebrações dominicais.
Missas de restauração das famílias, momentos de cura, emoções à flor da pele, bênçãos para encontrar emprego, grupos de oração, expressão corporal da fé: a gama de ofertas é ampla e variada.
No clímax da liturgia, durante a celebração de restauração das famílias, por exemplo, as luzes são apagadas e só restam as velas acesas pelos fiéis. Muitos choram.
Durante uma hora e meia, o Frei Renã parece uma versão do Padre Marcelo Rossi – referência para o sacerdote acreano. Com o microfone na mão, o sacerdote dá início a missa apresentando cerca de seis músicas, com os fiéis participando, reproduzindo os gestos. “Cantar é rezar duas vezes”, justifica o Frei Renã. Presença garantida nas missas, Áurea Freitas elogia: “ele é acolhedor e revestido do Espírito Santo”.
Quando termina o repertório musical, o Frei dá início a liturgia. O momento é sempre de muita emoção. Na homilia, aborda temas como amor de Deus, fé, conversão e assuntos ligados ao dia-a-dia dos fiéis. Ao término das missas, Frei Renã junta-se aos cristãos para benzê-los e abençoar os objetos levados por eles, como chave de casa e fotos das famílias, por exemplo. “Gosto de estar perto deles”, diz o religioso.
Formação sacerdotal
Natural de Rio Branco, Frei Renã iniciou sua formação no convento Servos de Maria, na capital acreana – aonde concluiu o ensino médio. Após dois anos, foi para Curitiba e cursou, durante 3 anos, o curso de filosofia. Em seguida, foi para Buenos Aires para uma etapa de formação mais interna, que se chama “noviciado”. Concluída esta etapa, retornou para a capital do Paraná para estudar teologia por quatro anos. “Após a conclusão do curso de teologia fiquei mais de dois anos, em Roma, fazendo mestrado em teologia dogmática. Assim, depois de ter terminado os estudos, fui transferido para o Rio de Janeiro para preparar-me para a profissão definitiva dos votos religioso e as ordenações: diaconal e sacerdotal, ficando no Rio por 2 anos e meio”, relembrou.
Frei Renã conheceu o movimento da Renovação Carismática Cristã (RCC), por volta de 1998, durante o retiro do carnaval chamado “Rio de Água Viva”. “Eu ia a este encontro com meu grupo de jovens, Jus*t. Fui tocado naquela primeira experiência. O trabalho com a música, dentro do movimento, me chamou muito a atenção. Era algo novo que estava conhecendo, mas logo me identifiquei com o estilo alegre e profundo de evangelização.”, disse.
Depois desta experiência, o Frei começou a participar de grupo de oração, fez retiros formativos propostos pela RCC: Seminário de Vida no Espírito, Aprofundamento de Dons. “Tudo o que aparecia lá eu estava. Entrei, de fato, para o movimento da Renovação Carismática atraído pela música católica que eu estava experimentando de um modo novo”, garantiu Frei Renã.
Assim como o Frei Renã, o Padre James tem sido muito importante para a igreja católica acreana. Quando chegou na Paróquia São Francisco de Assis, há exatamente dois anos, o público era pequeno. Mas, na base da propaganda boca a boca e de muito envolvimento na comunidade, o espaço, atualmente, fica lotado. É necessário colocar cadeiras extras para que possa comportar a quantidade de pessoas que vão assistir às missas.
“Sempre pedi à Deus para que me ajudasse a ser padre para anunciar Jesus de maneira alegre e de esperança renovada. Para mim, celebrar a Santa Missa é ter oportunidade de trazer Jesus ao povo por meio da palavra e da Eucaristia, e sempre tive convicção de que esse momento deve ser alegre e festivo. Afinal, é o banquete da vida”, analisa Padre James, dizendo que as pessoas retornam para suas casas de esperança renovada e com o coração cheio do amor de Deus.
Sempre com um semblante alegre, o Padre James percorre o centro da igreja para pregar a palavra de Deus – o que garante uma proximidade aos fiéis. “Fiz o meu colegial em escola de freiras, em Natal, no Rio Grande do Norte. Apesar de ser filha de pais católicos, eles não frequentavam missas. Mas, sempre fiz questão de participar das celebrações, pois a professora sempre perguntava quem tinha ido e eu queria levantar minha mão. Mas, a primeira vez que me senti tocada por Deus durante uma missa foi na celebração com o Padre James”, disse – bastante emocionada – a empresária Êrika Rosas.
As comunidades da Paróquia São Francisco de Assis localizadas às margens do Rio Acre, como é o caso da Nossa Senhora Aparecida, São Francisco do Panorama e Santa Paulina, também são contempladas com as missas do Padre James. “O acesso não é fácil. Há trechos que vamos à pé. Em outros, vamos de barco. Mas, o importante é levar a palavra de Deus”, garante o pároco.
Conhecendo o Padre James
Natural de Porto Walter, Padre James iniciou sua formação em Cruzeiro do Sul, no Acre, em 2005. Em 2007, foi morar em um seminário em Manaus, no Amazonas – ficou lá por três anos e cursou, ao mesmo tempo, filosofia e o curso técnico em comunicação pela fundação Rede Amazônica. Ao término desta período e com a conclusão da primeira faculdade, foi enviado, em 2010, para Campina Grande, na Paraíba – ficando por lá durante um ano em formação.
Em 2011, retornou para Manaus para começar a faculdade de Teologia e ao mesmo tempo jornalismo. Em 2014, terminou os estudos exigidos para o sacerdócio e foi ordenado Padre no dia 20 de dezembro em sua cidade natal. No ano seguinte, em 2015, foi enviado a Rio Branco para trabalhar numa área pastoral Santa Clara e ficou por dois anos. Agora, em 2017 retornará a Manaus para trabalhar como diretor de rádio e televisão.
“A decisão de ser pároco começou com o desejo de anunciar Jesus e falar do seu amor as pessoas. Ficava encantado quando via o padre celebrando a missa e atendendo as pessoas, indo ate os doentes, aconselhando e acolhendo o povo na igreja”, comentou Padre James. Para quem o conhece, sabe que é exatamente isto que ele faz.
Um novo jeito de ser igreja
Durante muitos anos o padre Mássimo Lombardi, enfrentou, sozinho, o desafio de celebrar missas com muitas músicas, louvores e orações. Com seu jeito carismático e empolgante, ele chegou a celebrar missas para mais de 10 mil pessoas durante o retiro de Carnaval Rio de Água Viva, organizado pela Renovação Carismática Católica, ginásio do Sesi.
E foram, justamente, essas missas que marcaram um novo momento da Igreja Católica no Acre, com o padre Mássimo sendo o grande responsável por uma verdadeira revolução na Diocese de Rio Branco.
Além das celebrações das missas, o sacerdote se preocupou em formar os fiéis, os chamados “servos”, que assumiram funções importantes, colaborando com o movimento em encontros denominados “Grupos de Oração”.
Esses encontros exerceram um papel importante para a acolhida e o retorno de muitos fiéis. Marcados por momentos de oração, louvor e músicas, os grupos foram se fortalecendo e conquistando pessoas.
“Consideramos os Grupos de Oração verdadeiros celeiros da graça da ação do Espírito Santo. Neles os fiéis participam de momentos de adoração, louvor, orações de cura, onde renovamos a fé no Cristo Jesus. Esses encontros acontecem nas Comunidades e, ao final do mês temos nossa missa diocesana, onde reunimos todos os fiéis para um momento importante de oração”, afirma o coordenador estadual da Renovação Carismática, Pedro Alexandre.
Para ele, o novo jeito de celebração das missas, que está sendo adotado até mesmo pelos padres que não fazem parte do movimento da Renovação Carismática, é uma resposta da igreja aos anseios da nova sociedade.
O padre Mássimo Lombardi, não participa tão ativamente da Renovação Carismática, mas seu estilo de celebrar missas continua arrastando multidões. Atualmente ele coordena um trabalho da igreja Católica na Cidade do Povo onde já consegue reunir centenas de fiéis nas missas e encontros de oração.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2012, os católicos permanecem sendo maioria, embora o número de fiéis tenha sofrido uma redução na última década (passou de 73,6%, em 2000, para 64,6%, em 2010) e haja uma maior diversidade religiosa da população brasileira.
A análise mostra que outros 22,2% da população são compostos por evangélicos, 8% por pessoas que se declaram sem religião, 3% por outros credos e 2% por espíritas.
De acordo com especialistas no assunto, sacerdotes com perfis do Frei Renã e Padre James, por exemplo, ajudam a igreja católica a combater a perda de fiéis para os evangélicos e a indiferença religiosa no nosso Estado.
“Ter padres que consigam atrair multidões sem ser celebridades é uma dádiva”, garante o religioso Frederico Lemos – empresário e que participa do movimento da Renovação Carismática Católica do Acre desde o início, em 1988. “Foi o Frei Gabriel quem realizou a primeira missa carismática aqui no Acre. Apenas 15 pessoas participaram lá na igreja Santa Inês. Aos poucos, os fiéis foram participando mais”, relembra.
“Os grupos carismáticos convocam a igreja a uma renovação para trazer de volta os fiéis e dar fôlego à instituição por meio de uma popularização baseada no modelo pentecostal”, acrescenta Frederico Lemos.
Segundo o portal da renovação carismática no Brasil, em janeiro de 1959, o Papa João XXIII convoca o Concílio Vaticano Segundo e na abertura o Papa diz: “Renova nestes dias as tuas maravilhas como um novo Pentecostes”. João XXIII morreu e seu sucessor, o Papa Paulo VI deu continuidade ao Concílio que foi encerrado em dezembro de 1965.
O Concílio propunha muitas mudanças, principalmente na parte Litúrgica. Não havia passado um ano do término do Concílio, quando despontou o fenômeno religioso que agora é chamado de “Renovação Carismática Católica”.
No outono de 1966, na Universidade de Duquesne (EUA), vários professores, estudantes, religiosos e sacerdotes católicos, resolveram reunir-se com freqüência para momentos de orações fervorosas. E nesses momentos dão-se conta que o Cristianismo não é uma filosofia, não é apenas adesão de um credo, mas é vida, e vida sobrenatural, participação na própria vida de Cristo ressuscitado. E esta vida é difundida em nossos corações pelo Espírito Santo.
Conscientes na força do Espírito Santo, que tanto impulsiona a igreja dos primeiros cristãos, em tais reuniões, começaram a ler e meditar o livro dos Atos dos Apóstolos, pedindo a efusão do Espírito. Louvavam o Senhor e os dons do Espírito Santo, diziam que se sentiam invadidos por uma profunda paz e alegria, um entusiasmo e desejo incontido de dar Testemunho a Deus.
Em pouco tempo o Movimento Carismático Católico propagou-se em outras universidades americanas e foi crescendo no país inteiro, transpondo os oceanos e se expandindo em quase todas as nações do mundo.
No Acre, o movimento da Renovação Carismática ganhou forças no final da década de 80, quando um grupo de fiéis decidiu realizar encontros nas igrejas e nas casas. Logo iniciaram os Grupos de Oração, realização de Seminários e outros encontros.
Na década de 90 a Renovação Carismática ganhou força e, até hoje, é o movimento que mais reúne fiéis da Igreja Católica, oferecendo além das missas e dos grupos de oração, oportunidade de formação através de seminários e outros encontros.