De Montevidéu – Uruguai – O mundo acordou assombrado com a vitória do ultra conservador Trump nos Estados Unidos. Mas essa é a tendência do momento que deverá dominar a geopolítica no Continente. Durante a reunião do Parlasul (Parlamento formado por deputados e senadores dos países do Mercosul), em Montevidéu, é possível sentir as mudanças na América do Sul. O “Bolivarianismo”, linha ideológica socialista, criada pelo falecido ex-presidente da Venezuela, Hugo Chaves, que ganhou força em vários países latino-americanos, está em plena decadência.
O resultado econômico e político desastroso do país que gerou essa tendência, depois de seguidos governos bolivarianos, é uma espécie de “prova do crime” que depõe contra as chamadas “forças de esquerda” na América do Sul. Os ditos “governos populares” acabaram se tornando ninhos de corrupção e ditaduras disfarçadas em que o poder político é mais importante que o bem estar social. Um erro que levará anos para ser corrigido e custará muito sofrimento para as populações mas pobres da América do Sul.
O caos instalado na Venezuela
Entrevistei o deputado venezuelano de oposição ao Governo de Nicolas Maduro, Lawrence Castro, do partido Voluntad Popular, que traçou um quadro obscuro da atual situação do seu país.
“A Venezuela passa por uma crise política profunda que afetou a nossa estabilidade econômica e social. Vivemos com uma inflação de 500% ao mês e uma severa escassez de alimentos. Sem falar na repressão e perseguição política do Governo de Maduro. E não temos o menor sinal de uma abertura e de respeito à nossa Constituição. A população está exigindo nas ruas um referendo para a alternância política do país e a renúncia do presidente. Pela intervenção da Santa Sé com a ajuda da OEA e de outras forças democráticas há um movimento para que o nosso povo possa se expressar eleitoralmente e fazer uma transição pacífica,” disse o parlamentar.
Relações comerciais entre partidos
O deputado Castro condena as relações comerciais que aconteceram entre os Governos de Chave e Maduro com os do PT de Lula e Dilma. Segundo ele, os negócios não eram entre empresas, mas entre partidos políticos.
“Isso foi um grande negócio. Empresas brasileiras vinculadas aos Governos do PT deixaram grande prejuízo para os dois países. Estamos investigando as atuações da Odebrecht. Também as diferentes exportadoras brasileiras que nos venderam produtos com preços superfaturados. Havia um projeto hegemônico elaborado para o domínio do Bolivarianismo no Continente Sul Americano. Foram modelos que se mantinham politicamente no poder pela corrupção, como o do ex-presidente Lula, que sendo investigado. O mesmo que aconteceu com os Kirchners na Argentina. Não houve relações comerciais entre esses países, mas relações entre partidos de governos. A maioria dos empresários ligados a esses governos de esquerda se beneficiaram e se tornaram milionários. A Venezuela investiga a perda de 200 bilhões de dólares nessas relações comerciais. Imagina-se que esse dinheiro esteja em Andorra e na Suíça,” garantiu.
Uma nova Argentina
A parlamentar do Mercosul argentina, Mariana Zuvic, também condena os governos chamados de populares na América do Sul. Ela é ligada politicamente ao atual presidente Mauricio Macri.
“Haviam governos populistas na Venezuela, na Argentina e no Brasil. A realidade que é não se trata de ideologia, mas de ética e decência na função pública. O populismo se traduz com a presença forte do Estado e, na verdade, foram governos nas mãos de delinquentes que diziam ser de esquerda e populistas. Privilegiaram as classes políticas que enriqueceram e empobreceram o povo. Eram ditaduras escudadas por eleições viciadas. Isso se passou na Argentina e conseguimos sair de forma pacífica e queremos que isso também aconteça no Brasil,” afirmou Mariana.
Quando se refere ao Brasil a parlamentar argentina acredita que a melhor saída para a mudança de governo teria sido via eleitoral.
“O que se passou no Brasil foi um processo doloroso que mostrou o limite de uma estafa social. Temos que recuperar algo que se perdeu que é a confiança das pessoas na classe política e a única maneira é dando exemplos positivos. O Parlasul, deveria ser um espaço para a integração regional que tem expressões ideológicas diferentes. Temos que nos unir por princípios básicos humanistas de não roubar, não matar e não usar os outros em nosso benefício. Mas o que vimos foram muitos abraçando bandeiras sociais nobres para, na realidade, cometer crimes e delitos,” vaticinou.
A palavra do líder do PT no Senado
Também conversei com o senador Humberto Costa (PT-PE) que participou do Parlasul. Ele analisou a mudança geopolítica no Continente.
“Nós vivemos ciclos históricos e há um processo internacional de maior abertura ao conservadorismo. Isso se sente também na Europa e nos Estados Unidos, onde Trump, como presidente, seria impensável há pouco tempo. No caso do Brasil comentemos alguns erros que contribuíram para esse processo de derrubada da presidente Dilma (PT),” refletiu o senador.
As causas do declínio do PT
Humberto Costa pontuou alguns fatores que contribuíram para o enfraquecimento do governo petista e, a sua consequente queda.
“O fato de termos disputado a eleição, em 2014, com um discurso e termos começado a governar com outras ações pesou muito. Lógico que a população avalia a importância de combater a corrupção, mas a condução da economia e a qualidade de vida continuam a ser os fatores mais importantes para a estabilidade de um governo. Acho que nós falhamos nisso no último Governo Dilma,” destacou.
Bolívia, como resistência da esquerda
Também conversei com a parlamentar Eliane Berton, do partido do atual presidente Evo Morales, um dos herdeiros do bolivarianismo. Ela acredita que essas transformações ideológicas nos governos sul americanos podem ser negativas para a população.
“Essas mudanças na América do Sul serão perigosas se colocarem em risco todos os trabalhos que foram feitos para o povo. Existe segurança social, e os mais oprimidos encontraram voz para falar. Os governos progressistas avançaram bastante. Estamos vendo as mudanças para tirar os governos de esquerda. Há um forte impulso em derrubar o presidente Maduro da Venezuela, ao invés de exigir que ele cumpra o seu trabalho em conjunto com todas as forças políticas do país. O mesmo se passou no Brasil em que derrubaram Dilma, que não cometeu nenhum delito. Esses processos são muito perigosos para a estabilidade da região,” pontuou a boliviana.
Rocha, a voz do Acre no Parlasul
O deputado federal Major Rocha (PSDB) tem sido um entusiasta do Parlasul. Ele acredita que o organismo poderá trazer benefícios para o Acre e os países fronteiriços.
“A tendência do Parlasul é se tornar pleno para deliberar, assim como aconteceu com a União Europeia. Existe a disponibilidade de recursos de um fundo para desenvolvimento na ordem de 100 milhões de dólares por ano. Esperamos ter acesso a parte desses recursos para investir no desenvolvimento sustentável do Acre. Mas além disso, aqui discutimos problemas relacionados à saúde, à segurança pública, ao tráfico de drogas, de armas, de pessoas e uma série de outras demandas sociais. Como por exemplo, a questão do uso e da preservação dos aquíferos. Portanto, o Acre ter um parlamentar para participar desses debates abre as perspectivas para atender os anseios do nosso povo,” disse Rocha.
A questão ideológica
Rocha se uniu a outros parlamentares sul americanos para criar um novo bloco político no Parlasul que se opõe ao Bolivarianismo.
“Até dois meses atrás tínhamos no Parlasul um único bloco de parlamentares bolivarianos. Eles comandavam os trabalhos. Mas com a nossa chegada e de outros parlamentares da oposição da Venezuela e da nova representação da Argentina criamos a Integração Democrática. Atualmente somos a maioria. Temos uma visão diferente do bolivarianismo. Assim o debate ideológico está abrindo espaço para os debates de propostas. Temos que avançar muito. Fechamos acordos com apenas três países que têm pouca relevância como Israel, Iraque e Irã. Nós queremos abertura de acordos para ter acesso aos mercados da Europa e do Bloco do Pacífico, muito importante ao Acre, porque congrega os Estados Unidos, o nosso vizinho Peru e a China,” finalizou o deputado.