As piores tramas cinematográficas são aquelas em que o final pode ser intuído pelo telespectador graças ao abuso que se faz dos clichês.
Na novela acriana sobre a CPI da BR-364 há personagens que posam de heróis – mas são bandidos –, e outros de cuja esperteza se pode desconfiar pelos reiterados sinais de patetice. O clichê, nesse caso, fica por nossa conta: a tal Comissão Parlamentar de Inquérito da rodovia que custou mais de 2 bilhões de reais acabará em pizza.
Vamos aos fatos. Após amargar a mendicância por uma mísera assinatura que compusesses as oito necessárias ao requerimento de instauração da CPI, seu autor, o deputado tucano Luís Gonzaga, age como se tivesse acertado na loteria ao ter obtido não uma, mas duas: a do outrora recalcitrante Nicolau Júnior (PP) e a do vira-casaca Nelson Sales (PV).
Sales, que fazia parte da base de apoio do governo, ignorou os pedidos de Gonzaga até o dia em que acertou, em Brasília, com o presidente interino Michel Temer, o tamanho do faz-me-ri caso mudasse de lado. E Nicolau Júnior trocou de ideia depois que o padrinho político Gladson Cameli (PP) teve um entrevero público com o colega Jorge Viana (PT) sobre a BR-364.
Protocolado o requerimento do parlamentar tucano, caberá à mesa diretora da Assembleia Legislativa cumprir o regimento da Casa.
E no Artigo 25 da Seção III do Capítulo II do regimento interno da Aleac está escrito que as comissões temporárias – como é o caso das CPIs – “são constituídas para fins predeterminados, por proposta da Mesa Diretora ou a requerimento de um terço, no mínimo, dos membros da Assembleia, com a aprovação da maioria absoluta”.
Conforme pode notar o leitor, ainda que o requerimento tenha as assinaturas necessárias para apresentação à mesa diretora, caberá ainda ao plenário do parlamento acatar ou não a instauração da CPI.
Com nove deputados de oposição na Casa, restam 15 (incluindo o presidente Ney Amorim, do PT), que estarão inclinados a recusar a proposta de investigação.
O tucano Luís Gonzaga pode satisfazer-se com os holofotes que lhe renderam a luta pela aprovação da CPI, mas certamente amargará uma derrota quando seu requerimento for à votação no plenário.
Basta lembrarmos que dia desses, ante a possibilidade de o requerimento de Gonzaga prosperar, o líder do governo na Aleac, Daniel Zen, apresentou, num único dia, propostas para abertura de três CPIs distintas.
Zen, espertamente, recorria ao regimento interno, que no mesmo Capítulo II, na Subseção II, Parágrafo 5º, determina que não será criada nenhuma nova CPI enquanto três outras estiverem funcionamento de forma concomitante, salvo por deliberação da maioria dos deputados.
O governo de Sebastião Viana, bem como os dos seus antecessores Binho Marques e Jorge Viana, não admite que se investigue a rodovia. As razões para isso ficarão, muito provavelmente, enterradas junto com os prejuízos causados ao erário público.
Portanto, a lama da BR-364 está longe de enxovalhar os alvos tapetes da Casa Rosada.
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