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Para mais vida, basta a morte

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Às vezes eu acho a morte injusta. É isso que sinto em quase todos os velórios. Lá estava um jovem de 19 anos dentro do caixão. Estudante universitário, futuro promissor, bom amigo, bom filho. O ambiente lúgubre, os pais choravam inconsoláveis enquanto amigos tentavam consolá-los. Eu não me arrisquei a proferir nenhuma frase decorada daquelas que são pronunciadas carregadas de pêsames: “não chore, ele está num lugar melhor, foi para um bom lugar…”. Para esses pais o melhor lugar do filho é ao lado deles.
Endureço nessas horas, pois acho a morte fria, desinteressada.
Ao mesmo tempo nos remete a uma reflexão. Parece nos avisar sobre o que realmente interessa na vida. Se soubéssemos o dia de sua chegada correríamos no tempo e espaço disponibilizado para pedir perdão e perdoar, viajar pelo mundo inteiro, amar sem medida, se libertar das futilidades (afinal, tudo parece fútil), retornar à primeira casa, à primeira rua em que aprendemos as pedaladas iniciais, à primeira escola. Mas não há aviso prévio.
Uma vez ouvi de uma pessoa que a morte é saudade. E é mesmo. É alguém que viajou para algum lugar distante e não voltou mais.
Acho que para nós, cadáveres em potencial, como diria Heráclito, só há um paliativo contra a morte: a lembrança. E quem lembra, ressuscita.

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