Mesmo com execução do “Plano B” DNIT não descarta a possiblidade de fechamento da rodovia ainda este ano. Projeto deveria ter ficado pronto em 2015, mas atrasou. Contrato definitivo corre o risco de não ser assinado até dezembro. Degradação na rodovia aumenta de forma rápida
Jairo Carioca – Reportagem Especial
Acredite: A BR 364 pode ser fechada por até três anos e isolar mais de 200 mil pessoas no Juruá e Amazonas. A afirmação é do supervisor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no Acre, Thiago Caetano, foi dada durante a 3ª reunião ordinária do Fórum Permanente de Prevenção e Combate à Corrupção, na última terça-feira (21), na sede do Tribunal de Contas do Estado, em Rio Branco. Para representantes do TCU, da AGU, MPF, CGE, CGU e MPE, Tiago revelou com detalhes muita coisa que pouca gente sabe sobre a construção da BR 364 e o que vem rolando nos gabinetes do Ministério dos Transportes, em Brasília, com relação ao projeto de restauração da única rodovia que liga a capital ao Juruá e aos municípios do oeste do estado do Amazonas. “Existe uma linha de pensamento de aguardar e jogar uma pressão pra cima dos governantes para poder garantir a obra de reconstrução” acrescentou Tiago em outro trecho de sua apresentação que o ac24horas começa a revelar com exclusividade.
Pelo relato que a reportagem teve acesso, as autoridades estaduais e federais correm contra o tempo depois de empurrarem com a barriga durante todo o ano de 2015, o projeto de reconstrução da rodovia. “A expectativa era que no final de 2015 a gente conseguisse finalizar o projeto para que neste ano de 2016 iniciasse a reconstrução, acontece que foi mudando, foi mudando, foi mudando…”
Em contrapartida, segundo Tiago, a degradação da rodovia acontece em ritmo acelerado, situação que foi impulsionada ano passado pela falta de balança para a medição de peso a partir de Sena Madureira. Um contrato sem repasse financeiro com o Estado, efetivado nos meses de setembro e outubro, possibilitou o controle de carga, mas o estrago já era grande, no trecho de 400 km mais de 80 pontos de erosão foram identificados.
“Demorou mais do que a gente esperava, o projeto veio ficar pronto somente em março e hoje se encontra na fase de análise, até para remover funcionários [engenheiros] é muita luta, tivemos que envolver o ministro dos transportes para conseguir levar essa demanda. O Acre é o único estado da federação que não tem uma Superintendência do DNIT” acrescentou Tiago.
O mais grave, ainda de acordo o supervisor é que mesmo nada ocorrendo de errado na fase de análise, audiência pública e licitação do projeto de restauração e manutenção da BR 364, pode não ocorrer uma janela de verão por três meses para o trabalho da empresa vencedora do contrato. Isto porque na melhor das hipóteses, a licitação estará sendo concluída no início do período invernoso.
“Antes de avançar nesse projeto estamos trazendo essa discussão pra cá por que a gente sabe que ainda assim há uma situação polêmica” comentou Tiago na reunião com o FOCCO.
A missão é praticamente impossível. O DNIT revelou que há uma linha de pensamento defendida por técnicos do CGU de que não adianta investir nenhum centavo na rodovia antes do projeto de reconstrução. O governo federal precisa desembolsar cerca de R$ 220 milhões do orçamento para manter a BR 364 aberta.
O grande questionamento diante do cenário econômico nada favorável vivido nacionalmente é: será que depois de investir R$ 220 milhões o Palácio do Planalto aplicaria mais R$ 1 bilhão na reconstrução da mesma rodovia?
Para tentar convencer as autoridades do governo federal o DNIT preparou dois cenários com as possibilidades de haver ou não execução do chamado Plano B na rodovia. Tiago deixou claro que ele e técnicos do órgão trabalham com a hipótese de restauração e manutenção do trecho de 400 km entre Sena Madureira e o Rio Liberdade.
O primeiro cenário é o de realização das obras de restauração, para a engenharia, a obra aumenta a capacidade da estrutura existente na BR, impede o avanço da degradação, sana pontualmente as patologias (erosões e buracos), além de preparar sub-base, evitando o fechamento da estrada.
O segundo cenário de fechamento da BR por dois ou três anos, aumentaria a degradação que é acelerada, impactaria o custo da reconstrução e impossibilitaria o início das obras de forma integrada por causa da complicada logística de transporte de material para os lotes extremos. Outro ponto crucial que seria prejudicado é o da fiscalização das obras pelo DNIT.
Decisão caiu no colo do governo estadual que ficou sem a presidente Dilma Rousseff em Brasília
Diante das câmeras, Sebastião Viana disse que o governo garantiu em maio – quando a presidente ainda era Dilma Roussefff – a liberação de R$ 230 milhões para a recuperação da BR-364 por meio do Programa de Contratação, Restauração e Manutenção por Resultados (Crema). E anunciou a continuidade da “integração do Acre”.
Até ai tudo bem. Mas como bem resumiu Tiago Caetano praticamente 24 horas depois do encontro com o governador em seu gabinete em Rio Branco: “Tudo que se faz nessa BR é polêmico”. E o supervisor tem razão.
O Crema segundo Tiago é uma restauração de menor porte, que exige no prazo de três ou quatro meses a execução do passivo, “o restante seria manutenção, a empresa ficaria mais dois anos e seria paga com uma taxa mensal”, explicou Tiago.
O que o governador não explicou ou deixou de esclarecer mesmo tendo amplo conhecimento sobre os fatos, são as condições de trabalho em pleno inverno amazônico – como a reportagem demonstrou acima – a chamada janela de três meses para o trabalho intenso de recuperação da rodovia. Para os representantes dos órgãos controladores, o supervisor do DNIT esclareceu:
“Nesse conceito a empresa (vencedora da licitação) não teria uma janela de dois ou três meses e, ainda que tenha, não cobriria todo esse passivo. Mesmo dividindo a obra em seis lotes não teria condições” disse Tiago.
Outro fator decisivo é a fase de transporte do material que no caso da brita, por exemplo, vem todo do estado de Rondônia e atravessa todo o estado para chegar nos lotes de obras. E por último, as fases burocráticas do processo, que diga-se de passagem, não veem sendo vistas como emergenciais por Brasília desde o governo Dilma, considerada amiga do Acre e que hoje está fora do poder.
“A empresa que ganhar a licitação ainda vai ter que complementar essas informações, o DNIT trata essa fase como anteprojeto, ainda sim, com coordenação, o risco existe, se não trabalharmos até o início de novembro a possibilidade de obras é zero” afirmou Tiago.
A bola na marca da cal está para o presidente Temer
Em ano de Olimpíadas – a tocha passou pelo Acre na última terça-feira (21) – aos 45 minutos do segundo tempo, poderíamos dizer que o presidente interino, Michel Temer, tem um pênalti para bater. Se acertar, ou seja, liberar mais de R$ 200 milhões para as obras de recuperação e manutenção da rodovia, ainda vai ter que torcer para que tudo saia como o planejado, evitando entrar para a história como o presidente que deixou o acesso para o Juruá fechar novamente.
Em Brasília, conhecedores da situação, deputados federais e senadores de oposição estão brigando pela vaga da supervisão do DNIT no Acre. Veem nessa situação uma oportunidade de projeção política. Querem a indicação da supervisão e prometida superintendência, os deputados federais Flaviano Melo (PMDB) e Alan Rick (PRB) e ainda, o senador Gladson Cameli (PP).
O tempo passa, o cargo continua com Tiago Caetano, visto por setores da oposição no Acre como um petista de carteirinha que atende aos pedidos do governador Sebastião Viana. Durante sua palestra para o Fórum, o supervisor citou o nome do senador Gladson Cameli como pessoa mais próxima do Ministro dos Transportes, mas alertou: “a cada dia que passa aumenta o custo de recuperação da rodovia” alertou Tiago.
200 mil pessoas podem sofrer com desabastecimento e desemprego
O assunto sobre a possibilidade de fechamento da BR 364 chegou como uma bomba para a população de Cruzeiro do Sul. E não poderia ser diferente. Mais de 200 mil pessoas podem ser afetadas pelo bloqueio em seis cidades do Acre e municípios do oeste do estado do Amazonas.
Uma audiência pública foi promovida pelo Ministério Público Federal envolvendo a população, comerciantes e o DNIT, em Cruzeiro do Sul, nela, comerciantes afirmaram que em caso de não serem avisados há tempo, pode acontecer desabastecimento de alimentos na cidade.
“Eles disseram que só tem estoque para dois meses em seus depósitos” voltou a alertar Tiago.
Foi no Jurupari, dia 28 de outubro de 2011, que o atual governador Sebastião Viana, acompanhado do irmão, senador Jorge Viana e Aníbal Diniz (ambos do PT) acompanharam a compactação do que a mídia do Palácio Rio Branco chamou dos últimos 100 metros que faltavam para ligar de vez todas as regiões do Acre.
Já naquela época, a promessa do governador era concluir a pavimentação da estrada no próximo ano, em 2012, o que nunca aconteceu. A BR, no entanto, permaneceu aberta durante todos esses anos e com isso, os comerciantes da região do Juruá abandonaram a logística de transportes de alimentos, gás e outros produtos através de balsas.
As consequências com o possível fechamento da rodovia iriam além do desabastecimento. A previsão é de aumento da passagem aérea, dificuldades na área de saúde e até o desemprego em massa.
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