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A Civilização do Muro

Por
Roberto Vaz

*Moisés Diniz


Ela nasceu há um milhão de anos, quando o Homo Erectus precisou das paredes das cavernas para se proteger do ambiente hostil, das feras e do clima. De lá para cá, passando pelo homo sapiens, o homem produziu uma drástica e absurda mudança: ergueu muros contra si mesmo e contra o seu semelhante.


Se antes, o homem primitivo procurava ou erguia muros, o objetivo era se proteger do ambiente hostil. A mudança se processou quando o homem se tornou ‘civilizado’, naquela instante maldito em que alguns se apropriaram do trabalho alheio, produzindo a riqueza privada.


O homem passou a erguer muros para se proteger do seu ‘semelhante’, nesse caso, um semelhante com acentuadas diferenças físicas e sociais. Um semelhante desdentado, pés descalços, preferencialmente negro, analfabeto e sempre em busca de alimento escasso.


E aqueles que viviam enjaulados descobriram que melhor seria enjaular estes que os ameaçavam. Assim o fizeram. O mundo tem, hoje, 8,5 milhões de presidiários, de acordo com o Instituto de Investigação Sentencing Project, gastando 164 bilhões de dólares anuais para mantê-los. De nada adiantou. Os dois continuaram cada um em suas jaulas, umas suntuosas e confortáveis, outras malcheirosas e congestionadas. Amedrontados nas primeiras e sodomizados nas últimas.


Até aí as ideias tinham se tornado muros privados, ora público-carcerários. Ainda faltava a mais estúpida das criações humanas: o muro político. O primeiro nasceu em 13 de agosto de 1961, pelas mãos de um bastardo do socialismo, chamado Nikita Krushev. Conhecido como Muro de Berlim, o pavoroso Mauer, na linguagem alemã, separava a Alemanha em duas, a capitalista e a intitulada socialista.


O Muro de Berlim media 155 quilômetros, com 3,6 metros de altura, 302 torres de observação e 20 bunkers. Ao longo de quase trinta anos de sua existência, foram assassinadas 192 pessoas, ao tentarem ultrapassá-lo, numa média de seis mortes por ano. O Mauer ficou na história da humanidade como símbolo da intolerância e da ausência de liberdade.


Creditado na conta do socialismo, o Muro de Berlim alimentou partidos e formações reacionárias e matou a beleza das ideias socialistas. Em qualquer vilarejo do planeta, o pavoroso Mauer era vinculado ao militante socialista. A liberdade que aspirávamos foi soterrada por 155 quilômetros de pedra. Pagamos caro pela ação nefasta de um psicopata das ideias libertárias, Nikita Krushev, um gorila que se intitulava comunista.


Foi então que o capitalismo se sentiu ofendido e decidiu construir, também, os seus Muros da Vergonha. Atualmente, a um custo de 1,5 bilhão de dólares, Israel está construindo um muro contornando a Cisjordânia, território onde vivem milhares de palestinos. Após a sua conclusão, cerca de 300 mil palestinos ficarão isolados em apenas 42% do território da Cisjordânia.


O novo Muro da Vergonha é bem maior, mais alto e mais sofisticado do que o Mauer de Berlim. Ele medirá 650 quilômetros, quando concluído. Atualmente, há 225 quilômetros de muro já construídos, medindo 8 metros de altura. O Mauer israelense tem sensores eletrônicos e câmeras de vídeo, uma cerca espiral de arame farpado, do lado palestino, e um fosso, com 2 metros de profundidade.


Em vários trechos, o Muro de Israel separa os agricultores palestinos de suas lavouras, pastos e nascentes de água. Outro problema é que centenas de famílias estão privadas de usar hospitais e escolas que ficaram do outro lado do muro. Os israelenses dizem: musakkar!, e os palestinos respondem: maftooh! É a eterna guerra entre o diálogo e a intolerância.


Comparando o pavor entre os dois muros, o de Berlim e o de Israel, a monstruosidade se destaca pela quantidade de mortes. Nos primeiros quatro anos da Segunda Intifada, a revolução das pedras, foram assassinados 2.827 palestinos, dentre os quais, 558 crianças. Isso dá uma média de 706 mortes por ano. Até agora, apenas um soldado israelense foi condenado. Sem contar os 7.366 palestinos presos em Israel, do outro lado do muro.


Como se pode perceber, o Muro de Israel substituiu e superou o Muro de Berlim, em altura, em comprimento, em crimes e em sangue inocente. Mas, os dois são uma vergonha para a humanidade. Só que o Muro de Israel ainda existe e está em construção. E ainda está chegando mais um.


Para completar a tragédia desse início de milênio, os paladinos da democracia estão organizando a construção do seu Mauer. Chamada de Iniciativa Sensenbrenner, apresentada pelos republicanos James Sensenbrenner e Peter King, o congresso norte-americano votou a construção de um muro separando os Estados Unidos do México, numa extensão de mil quilômetros.


Aqui, o objetivo não será separar capitalistas de socialistas, ou israelenses de palestinos, mas, bloquear a entrada de imigrantes mexicanos e latinos. Cada vez mais, como se pode ver, os muros separam os ricos dos pobres. E, até agora, ninguém apresentou uma solução para o fim desses muros, que não seja a partilha dos bens do planeta, a fraternidade, a igualdade, a liberdade e a solidariedade humana.


Moisés Diniz é membro da Academia Acreana de Letras e autor do livro O Santo de Deus.


 


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Roberto Vaz

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