A felicidade é um estado transitório. Uma espécie de ruptura no cotidiano da gente. Chega e vai embora numa fração de segundo. Não espera nem que a gente se acostume. Deixa sempre na nossa boca um gostinho de quero mais. Mas ninguém se perceberia feliz se a felicidade fosse eterna. Aí está o nó da questão. Aí é que está.
O sofrimento, por outro lado, de forma diametralmente oposta à sensação de bem-estar, euforia e êxtase, quando chega estabelece morada no coração. Não quer ir embora de jeito nenhum. Finca o pé. Cria raízes. Por mais que a gente lute para expulsá-lo, ele vai ficando por ali, teimosamente, resistindo sem qualquer pudor.
Teço essas considerações por conta de dois aniversários ocorridos nos últimos dias. O primeiro, no dia 21 de junho, diz respeito aos 45 anos do tricampeonato da seleção brasileira de futebol, no México. Aqueles 4 a 1 sobre a Itália que nos levaram ao delírio. O segundo, no dia 8 de julho, referente a um ano depois daquele fatídico 7 a 1 que a mesma seleção levou da Alemanha, na Belo Horizonte das Minas Gerais.
No momento da glória eu era um adolescente de 13 anos e morava numa pequena travessa do bairro da Capoeira, em Rio Branco, capital do Estado do Acre. Era um tempo em que não havia emissoras de televisão na referida cidade. Todo mundo acompanhava o jogo pelo rádio. A voz do narrador ecoava no meu ouvido e eu imaginava a evolução dos craques no gramado até o ponto final no gol inimigo.
Aquela seleção era um time formado pelo sonho. Félix, Carlos Alberto Torres, Brito, Wilson Piazza, Everaldo, Clodoaldo, Gerson, Rivelino, Jairzinho, Pelé e Tostão como que desfilavam nos gramados mexicanos. Zagalo, sucessor de João Saldanha, comandava as feras… E todos os que o destino fez cruzar o caminho brasileiro foram trucidados. O planeta quedou-se deslumbrado e reverente. Felicidade total e absoluta!
No momento do terror, eu já era um senhor de 57 anos e, apesar de morar na mesma Rio Branco de outrora, o bairro e a rua eram outros: Jardim Tropical, Rua Dama da Noite etc. Diferentemente da época do rádio, um enorme televisor em cores me trazia as imagens em tempo real. Eu nem precisava imaginar coisa alguma, tudo estava ali à minha frente, em câmera normal ou lenta… Um filme de refinado terror!
Essa seleção que levou de 7 a 1 da Alemanha, em 2014, nem de longe lembrou o pessoal de 1970. Sem alma, com alguns jogadores estampando o medo na forma de lágrimas torrenciais, foi simplesmente destroçada em campo. Não creio que nem o mais otimista torcedor alemão imaginasse que aquilo pudesse acontecer. O hino cantado a plenos pulmões se transformou numa sinfonia desafinada. Tristeza plena!
A seleção de 1970 veio à luz com a missão de colorir e embelezar o mundo. A seleção de 2014 veio para desfazer a nossa soberba de melhores futebolistas da Terra. O dia da felicidade a gente jamais vai esquecer, mas nos sobrevém uma sensação nostálgica de que ele nunca mais retornará. Passou num instante. O dia da tristeza, ao contrário, vai permanecendo por aqui. É um retrato na parede que não para de doer!