Depois de 45 anos de ausência, eis que reencontrei um amigo de infância na noite dessa recente quarta-feira, 8 de abril. Marcamos encontro na Arena da Floresta. Lugar mais do Áque apropriado, uma vez que o futebol foi, desde o final da década de 1960, a nossa paixão, tanto por conta das peladas de rua como pelo amor que devotávamos aos craques locais.
Fomos para o último andar das arquibancadas, do lado onde ficam as cabines de rádio. A vista é magnífica do local. De cima para baixo dá pra gente ver com perfeição o desenho tático dos times no campo de jogo. O gramado verde estendido ali aos nossos olhos… Mas a gente não viu quase nada dos jogos. É que a nossa vontade de lembrar outro tempo era maior.
Sujeito de memória prodigiosa, o meu amigo Henry Conde, que migrou com a família para São Paulo no final de 1970, ia lembrando detalhes da nossa pré-adolescência e fazendo com que, ao mesmo tempo, muita coisa que eu já arquivara num lugar qualquer da minha acentuada “deslembrança” fosse aflorando e jogando para fora imagens esmaecidas.
Vários craques do futebol acreano do passado foram lembrados pelo Henry durante a nossa conversa. Alguns, ele se deteve por mais tempo, ora perguntando por onde andavam, ora para contar passagens que os olhos dele de menino gravaram na distância da eternidade. Dois craques, porém, o Henry passou mais minutos discorrendo sobre eles: Dadão e Euzébio.
A respeito do Dadão, a opinião do Henry, de que ele foi simplesmente o melhor de todos no futebol acreano, é definitiva e bate com a de muitos de nós que vimos o referido ex-jogador atuando. “Para mim foi uma injustiça do destino que o Dadão não tenha virado um ídolo nacional. Ele era sensacional, quase mágico mesmo”, afirmou o meu amigo Henry.
Quanto ao Euzébio, a impressionante memória do Henry fez fluir duas cenas, uma de dentro e outra de fora do campo. “Duas coisas eu nunca esqueci do Euzébio: aquela passada larga com a bola grudada nos pés e as advertências que ele, que era fiscal da prefeitura, me dava porque eu vendia doces nas esquinas sem a devida licença”, contou o Henry mirando o nada.
Das nossas conversas de meninos pobres, cuja noção de horizonte visual não ia muito além do muro do estádio José de Melo (nós morávamos numa das travessas do bairro da Capoeira), o que o Henry arrastou (mais do coração do que da memória) para o presente foi uma reportagem da revista Placar que garantia ser o inglês Gordon Banks o melhor goleiro do mundo.
“Foi você quem leu pra mim”, falou o Henry. E continuou, dizendo que passou meses imaginando ser impossível fazer um gol naquele súdito da rainha. Foi assim o encontro com o meu amigo de infância. Despedimo-nos sem saber se ainda nos veremos. Mas dessa vez, pelo menos, aprisionamos a imagem um do outro nas nossas câmeras fotográficas!
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