Quando foi concluída em 2010, a Estrada do Pacífico era a certeza definitiva da integração comercial entre o Brasil, através do Acre, e o Peru. Porém, cinco anos se passaram e a rodovia Interoceânica, primeiro eixo multimodal Atlântico-Pacífico da América do Sul, é pouco utilizada como corredor pelos dois países. São 1,9 mil km da fronteira em Assis Brasil ate Lima, capital do Peru, e 1,4 mil km até o Porto de Illo, na costa peruana do Pacífico.
Se em anos passados, o grande problema era a falta de uma rodovia asfaltada com ligação até os portos do Pacífico, hoje o problema não é mais esse. Agora o vilão da integração Brasil-Peru tem nome: burocracia. E do governo brasileiro. Depois, falta de vontade política, além da ausência de um acordo bilateral para que o cruzamento de produtos na fronteira seja mais organizado e rápido. A prova da negligência do governo brasileiro se reflete nas condições da estrada do lado brasileiro. Há trechos entre Xapuri, Brasiléia e Assis Brasil esburacados dificultando o acesso dos veículos.
Com o objetivo de que essa integração saia de vez do papel, a Associação Comercial do Acre pela primeira vez, sem a presença do governo, promoveu uma missão especial de encontros com representantes de setores responsáveis pelo comércio e exportação em Lima, capital peruana.
A missão, comandada pelo presidente da Acisa, Jurilande Aragão Silva, e o diretor de Relações Internacionais da Associação Comercial, Felipe Gonzales, percorreu quatro dos principais setores de relações de mercado do Peru, com o objetivo de reascender as relações entre o Acre e o país vizinho e manter uma agenda permanente de contatos com os representantes do setor empresarial peruano. Foram quatro dias seguidos de reuniões nas sedes de órgãos com representatividade em todo o Peru.
Em todos as reuniões, as autoridades peruanas reclamaram igualmente que a burocracia do lado brasileiro é o maior problema para o intercâmbio entre os dois países. No primeiro encontro ocorrido na sede da Câmara do Comércio de Lima, a missão acreana foi recebida pelo gerente da entidade, Carlos García Jerl.
Em reunião na Adex, a Associação dos Exportadores do Peru, instituição que congrega as mais importantes empresas do ramo no país, os representantes da Acisa conversaram, entre outras coisas, com o gerente de Defensoria do Exportador da entidade, Juan Carlos León Siles, sobre o frete pela Inteorceânica. Na oportunidade foram debatidos os altos preços cobrados e a legislação do motorista no Brasil.
Para se ter uma ideia, o transporte de cargas entre Lima e São Paulo custa cerca de 12 mil dólares. O alto preço do serviço está fazendo algumas empresas recuarem e a pensarem em contratar transportadoras do próprio Peru, que cobram bem menos pelo serviço.
Para Juan Carlos, porém, a Amazônia brasileira é viável porque está mais próxima e as relações teriam menos custos, embora ele reconheça o poder do mercado da região sul e sudeste do Brasil.
“Já temos contato com o Brasil, já temos um trabalhos com o Brasil, mas realmente falta um contato com o Acre. Temos contato São Paulo, o Rio de Janeiro. Não temos outra coisa a fazer. Temos que começar a negociar logo. Essa questão do frete é um ponto importante”.
Felipe Gonzales, empresário do ramo de distribuidora de alimentos no Acre, vê o frete como um outro ponto decisivo na lentidão do intercâmbio.
Do encontro nasceu uma primeira rede de contatos via internet entre os empresários peruanos e brasileiros. A Adex passou um comunicado para todos os seus associados no Peru sobre a presença da missão empresarial brasileira no país.
Empresários brasileiros e peruanos sonham com um centro integrado alfandegário na fronteira entre os dois países, que vivem problemas semelhantes na entrada e saída de cargas: demora no atendimento e poucos servidores.
Em Assis Brasil, do lado brasileiro, a alfândega funciona de forma precária com poucos servidores que alternam turnos a cada 15 dias. Na Receita Federal há quatro auditores fiscais e um técnico, e na Polícia Federal, quatro agentes. Já no posto do Ministério da Agricultura, órgão que verifica as certidões sanitárias dos produtos animais e vegetais, não havia ninguém atendendo às 10h da manhã do sábado, 28.
O empresário Adem Araújo, proprietário da rede de supermercados Araújo, a maior do Acre, desistiu nos últimos meses de importar produtos como cebola, tomate, uva e alho por causa da alta do dólar ante o real. A moeda americana encerrou o 1º trimestre de 2015 com alta acumulada de 20% em relação a moeda brasileira. Em relação ao novo sol, a moeda peruana, o real também perdeu o valor.
“O que me causou grande surpresa foi a relação custo real-sóles. Das últimas três ou quatro vezes que estive em Lima, nos últimos três anos, a última foi em agosto do ano passado, a moeda peruana estava sempre numa faixa de 1,20 a 1,40 do valor do real. Hoje andando nos centros comerciais de Lima os cambistas cobravam até 0,70 centavos de sol por um real. Isso já é outra barreira que empresários tem sustado suas negociações com o Peru. E o ponto positivo é o crescimento econômico e amadurecimento político deste país que só tem dado lições nos outros coirmãos da América Latina. O Peru tem um crescimento satisfatório de 5% a 8% ao ano. Isso a gente não deve desprezar no nosso vizinho”, disse Jurilande Aragão.
Com larga experiência em relações internacionais, o embaixador Guido Loayaza, diretor geral do Ministério das Relações Exteriores do Peru, afirma o que o Peru tem feito o que pode para estreitar o intercâmbio com o Brasil, porém tem esbarrado na burocracia.
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“A América Latina é uma reserva para o mundo, mas não se entende. Isso é uma pena. Estamos tão perto aqui, mas falta vontade política para acontecer. E não há mais razão para não acontecer. O Brasil tem mudar o pensamento. É um país que tem uma econômia forte que tem que mudar o pensamento. Temos crescido em média 7,5% nos últimos 15 anos em média. Nós estamos fazendo de tudo para ter essa relação mais estreita com o Brasil, mas infelizmente no Brasil a burocracia aflora”, diz o embaixador.
Os peruanos reclamam ainda que o Brasil mantém medidas para-tarifárias que freiam o livre comércio com outros países. Segundo o Trade Alert das Nações Unidas, o Brasil adota 251 barreiras comerciais.
De acordo com um levantamento da Associação de Exportadores do Peru, o Brasil segue como sexto principal destino das exportações peruanas, depois da China, Estados Unidos, Suíça, Canadá e Japão. O país concentra 4% do total das exportações peruanas.
A Adex informou que no primeiro trimestre do ano passado, por problemas criados do lado brasileiro, o intercâmbio entre Brasil e Peru caiu 10,8% . As exportações peruanas para o Brasil somaram US$ 487,6 milhões no primeiro quadrimestre, valor inferior ao registrado no mesmo período de 2013.
O mercado de cobre, por exemplo, que representa 34% das exportações do Peru para o Brasil foi afetado de forma significativa. Houve retrocesso também em setores como a pesca tradicional e não tradicional, mineração e no setor metal-mecânico.
Outros produtos além do cobre com a gasolina, minérios em geral, carburadores, azeitonas, e algodão também na lista da queda da exportação para o Brasil.
Nessa relação, o Acre teria para oferecer dois de seus principais produtos: a carne de gado e a madeira, que muito interessam aos peruanos. Além disso, uma parceria entre os principais distribuidores do estado com as indústrias do centro-sul do país podem ajudar o Acre a exportar produtos industrializados.
“A carne e a madeira são os principais produtos que poderíamos oferecer ao Peru. Mas pela facilidade que a estrada nos propõe os nossos grandes distribuidores locais poderiam exportar produtos originários do centro-sul do país. Cosméticos, por exemplo”, afirma o presidente da Acisa.
Para o empresário Felipe Gonzales, diretor de Relações Internacionais da Acisa, num primeiro momento exportar para a Amazônia peruana seria um bom começo.
“Se o distribuidor fizer uma parceria direta com a indústria podemos exportar óleo, açúcar, que são produtos básicos. Exportar pelo menos para o Puerto Maldonado, na região da Amazônia peruana seria possível”.
Inaugurada em maio de 2009, a primeira rota internacional terrestre de turismo saindo de Rio Branco com destino a Porto Maldonado sob o comando da empresa de turismo peruana Movil Tours, deixou de fazer a rota em novembro do ano passado.
A empresa alegou na época entre os motivos para desistir da rota, o transporte irregular praticado por taxistas, a pouca procura por parte de brasileiros e peruanos e o excesso de multas aplicadas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Hoje, a empresa Ormeños faz a linha São Paulo-Lima usando o Acre como rota. As viagens são feitas a cada 15 dias. Os ônibus percorrem seis mil quilômetros saindo de São Paulo cruzando cinco estados brasileiros e sete departamentos peruanos até a capital do Peru.
A rota aérea entre a capital do Acre e Lima, com escala em Cusco, criada em 2009, também durou pouco. A Star Peru, empresa que fazia a rota, desistiu de fazer os voos por causa da pouca procura do acreanos.
De acordo com o Consulado Peruano no Acre, o Peru recebe por ano cerca de 30 mil turistas brasileiros. A maioria procura o país como destino nas férias de fim de ano. Cusco é o lugar de preferência dos brasileiros. Essa é época em que a Estrada do Pacífico apresenta maior movimentação.
Formado em marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing do Estado de São Paulo e com vasta atuação no associativismo no Acre desde 1997, Jurilande Aragão, que também preside o Conselho Deliberativo do Sebrae-Acre, afirma, entre outras coisas, que é preciso decisão política do lado brasileiro para a concretização do intercâmbio, lamenta os entraves burocráticos e avalia que a missão da Acisa reascende a agenda mútua entre os empresários peruanos e acreanos.
ac2horas – Após a primeira missão institucional da Acisa do Acre, no Peru, qual a sua avaliação?
Jurilande Aragão – Fico feliz porque a gente viu uma coisa que estava parada ser reativada. O que a gente viu foi as entidades que visitamos dar uma credibilidade a essa missão e a partir daí eles passaram a acreditar novamente nesse intercâmbio. E nós temos a obrigação de dar continuidade a isso, e é o que vamos fazer.
ac24horas – Qual o primeiro resultado prático dessa visita?
Jurilande Aragão – Prático, veja bem, nós não viemos atrás desse resultado prático para agora. Nós viemos fazer um primeiro contato. Viemos aqui apresentar toda a estrutura e buscar deles um apoio para que essa burocracia, dita com empersilho maior, possa ser resolvida pra ver o que eles podem fazer. Temos que agir. Acredito que a classe política do Acre tem a obrigação de buscar isso em Brasília.
ac4horas – E qual a sugestão da Acisa?
Jurilande Aragão – A sugestão eu já disse na pergunta anterior. A sugestão é buscar os políticos, os oito deputados federais, os três senadores, a influência que o governador do Acre tem em Brasília, que a gente sabe que tem, com o Mercadante (chefe da Casa Civil), com as pessoas que estão lá no poder, para que essa burocracia seja de pronto interrompido.
ac24horas – Desde o começo dos anos 1980, com o então governador Nabor Junior, passando por outros políticos, governadores, empresários do Acre, fala-se em intercâmbio com o Peru, mas essa relação nunca se concretizou, nem mesmo agora com a rodovia do Pacífico; o que é preciso para que de fato esse intercâmbio saia do papel?
Jurilande Aragão – É o samba de uma nota só. E essa nota só você já colocou na própria pergunta: é a burocracia. Nós temos que mais uma vez buscar aonde quer que seja, se é na Receita Federal, se é Ministério da Agricultura, se é o Ministério da Saúde, nós que conscientizar, mas é porque ninguém acredita, porque ninguém vê nada. Agora ninguém vai vê nada nunca se não tiver a estrutura. Se o concurso com que a Receita Federal faz e passar três nesse concurso e ninguém quer vir para Assis Brasil o problema é como é que é feito esse concurso. Porque eu não posso admitir que para entrar na Receita Federal uma pessoa vá escolher onde vai ficar. Então nós temos que bater, bater e bater novamente para fazer com que esse samba tenham umas notas diferentes, não essa nota da burocracia.
ac24horas – O Acre está de fato preparado para esse intercâmbio?
Jurilande Aragão – Os nossos supermercados, os nossos distribuidores já tem consciência do que é importante pra gente ter em Rio Branco vindo do Peru. Mas vindo Peru como? Vindo Peru com uma distância menor e vindo do Peru com um custo menor. E isso vai proporcionar ao consumidor acreano ter um produto de ótima qualidade, como já foi comprovado, com um preço menor e uma distância menor, e isso é o que vai contentar o empresário.
ac24horas – Depois dessa missão da Acisa qual é o próximo passo da Associação dentro do Acre?
Jurilande Aragão – Veja bem, o cônsul do Peru já nos avisou que nos mês de junho ou julho ele vai fazer um congresso, entre as autoridades peruana, embaixador do Peru, algumas pessoas de Rondônia e do Mato Grosso vão fazer um encontro no Acre para debater esses assuntos. E não se engane, o Peru tem muito interesse e pessoas capacitadas, tem estrutura pronta lá e o que ele está esperando é a nossa parte.
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