Os protestos contra os gastos do governo com a Copa do Mundo, que será organizada no Brasil a partir de junho, trouxeram à tona o clamor da população pelo aumento do investimento em educação. Cartazes com frases como “Quantas escolas valem um Maracanã” ou “Não quero a Copa, quero saúde e educação” têm sido avistados nos atos de rua organizados no País.
A crítica é justificável. O governo federal prevê que o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) deverá repassar para as escolas pouco mais de R$ 2.285,57 por aluno do ensino fundamental em 2014.
No ano passado, o gasto mínimo por aluno da educação básica pública foi de R$ 2.287,87, segundo portaria divulgada pelo MEC (Ministério da Educação) no DOU (Diário Oficial da União) da última terça-feira (29).
Fazendo uma comparação com um levantamento da ONG dinamarquesa Play The Game, que estimou que cada assento dos estádios da Copa no Brasil custará R$ 13.500 (US$ 5.800), é possível determinar que o dinheiro gasto por assento paga as despesas anuais de quase 6 estudantes.
Além disso, se os R$ 25,7 bilhões usados na organização da Copa [dado do portal da transparência] tivessem sido aplicados nas escolas, o País poderia promover o acesso de todos os alunos que estão fora das creches e do ensino médio. A ONG Todos pela Educação apontou que o Brasil tinha pouco mais de 3 milhões de crianças na faixa etária que vai dos 4 aos 17 anos fora das instituições de ensino no ano passado.
O valor necessário para criar todas essas vagas seria de R$ 11,7 bilhões nas creches e R$ 4,7 bilhões no ensino médio, de acordo com dados de 2012 do CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial) da ONG Todos pela Educação. O levantamento determina qual o investimento necessário para promover o acesso e a qualidade de ensino no País.
Qualidade e investimento em infraestrutura
Além da inclusão, o CAQi apontou que cada aluno matriculados nas creches em tempo integral deveriam receber R$ 8.288,28 de investimento do governo por ano. Em 2013, porém, o Fundeb destinou R$ 2.285 por aluno destas unidades. No ensino médio a diferença também aponta um aporte menor. Foram empregados cerca de R$ 2.500 por aluno enquanto o índice de qualidade determinava investimento de pouco mais de R$ 3.000.
Especialistas consultados pelo R7 foram unânimes ao constatar que a educação tem recursos insuficientes. Para José Marcelino de Rezende Pinto, professor de política educacional da USP (Universidade de São Paulo), o dinheiro da Copa deveria ter sido aplicado em projetos para melhorar a infraestrutura das escolas brasileiras.
— Os estádios de Manaus, Brasília e Cuiabá, por exemplo, foram construídos para um evento que vai durar cerca de 30 dias. Depois eles correm o risco de se tornarem verdadeiros “elefantes brancos”. Este dinheiro deveria ter sido usado para melhorar milhares de escolas. Hoje, menos de 1% dos colégios brasileiros funcionam em condições ideais.
O dado citado pelo professor veio de um estudo realizado pelos pesquisadores Joaquim José Soares Neto, Girlene Ribeiro de Jesus e Camila Akemi Karino, da UnB (Universidade de Brasília), e Dalton Francisco de Andrade, da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
Juntos, eles criaram uma escala para medir a qualidade da infraestrutura escolar a partir de dados divulgados pelo Censo Escolar 2011 do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), com informações de 194.932 colégios da rede pública e privada, de áreas rurais e urbanas.
Hoje apenas 0,6% das unidades de ensino no País apresentam condições avançadas, ou seja, prédios com sala de professores, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva, parque infantil, laboratório de ciências e áreas adequadas para atender a estudantes com necessidades especiais.
A maioria dos colégios (84,5%) tem apenas o que os pesquisadores classificaram como estruturas elementares ou básicas: água, banheiro, energia, esgoto, cozinha, sala de diretoria e equipamentos como TV, DVD, computadores e impressora. O professor da UnB e ex-diretor do Inep, Joaquim José Soares Neto, explicou que a constatação mais preocupante da escala foi a descoberta de que 44% das escolas funcionam em condições elementares, ou seja, em prédios quase sem equipamentos ou recursos para atender os alunos.
Elas representam quase metade das unidades de ensino e atendem, no geral, alunos da pré-escola até o nono ano que vivem em municípios pequenos ou na área rural.
— Descobrimos que quase sete milhões de brasileiros, ou seja, 13% dos alunos, estudam em locais com infraestrutura elementar. A quantidade de estudantes que enfrentam condições mínimas de infraestrutura pode parecer baixa, mas é igual a da população da Suécia. Isso é muito preocupante.
Neto explica que o problema do financiamento da educação é muito complexo e que fazer uma comparação com os recursos empregados na Copa pode ser um caminho inadequado. Para ele, antes de polemizar se é corretor usar recursos para sediar grandes eventos esportivos, é preciso pensar maneiras de resolver os problemas e determinar uma nova política de investimento nas escolas.
Mesmo assim, o especialista foi enfático ao frisar que o dinheiro aplicado pelo governo na área da educação está muito abaixo do necessário.
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