Artigo – Um ato de desprezo à democracia

João Correia

Em 2008, ocorreu um fato inusitado em nosso Pais: por uma lei de nº 11.662 – proposta pelo Senador Tião Viana e sancionada às pressas pelo Presidente Lula – foi eliminado um fuso horário dos  quatro  do Brasil e o dia encolheu em uma hora, passando a ter somente vinte três das antigas e tradicionais vinte e quatro horas. Os autores da lei, sem duvida ousados, esqueceram de combinar com o sol e o movimento de rotação da terra.

Desta forma, o Acre, cujo  horário sempre fora duas horas antes do de Brasília, passou a ser de apenas uma. É ocioso dizer que a referida Lei, acompanhada da mudança imediata, causou aos cidadãos acreanos enormes surpresa e perplexidade.

Os malefícios do horário imposto são diversos: vão da facilidade de acesso pelas crianças a programas televisivos impróprios – excessivamente erotisados – até às dificuldades de comparecimento das crianças à rede escolar matinal ( ainda de noite), dentre outros.

Vale mencionar, ainda, que o Acre está no pódio nacional do triste indicador de gravidez de crianças e adolescentes; a simultaneidade da veiculação televisiva de Fernando de Noronha  ao Acre pode estar na raiz desta incomôda realidade.

Para dirimir os conflitos na sociedade, causados pela imposição do novo horário, foi aprovada a realização de um REFERENDO, no segundo turno das eleições de 2010. A proposta, de autoria do Deputado Flaviano Melo, resultou em Decreto Legislativo determinando a realização do REFERENDO sobre o horário imposto ou o horário natural.

O REFERENDO, em tela, foi realizado no segundo turno das eleições gerais de 2010. A liberdade de informação e expressão neste pleito foi admirável; todos os que desejaram manifestar seus argumentos obtiveram o direito de fazê-lo. Dessa forma, foi realizado o terceiro referendo da história do Brasil.

As urnas revelaram que 57% dos cidadãos do Acre recusaram o horário imposto e votaram favoravelmente ao retorno imediato do horário da natureza.

Desgraçadamente, a decisão dos cidadãos do Acre não foi respeitada. Alegando  interesses públicos,estranhíssimos, diga –se, a Presidente Dilma Roussef vetou a decisão da maioria dos acreanos.

O artigo 14 da Constituição Federal que trata da soberania popular e dos direitos políticos é luminar: Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: (ECR Nº 4/94 E EC Nº 16/97)

I – Plebiscito;

II – Referendo;

III – Iniciativa Popular.

A  Constituição do Brasil fala em soberania  popular, órgão constitutivo supremo do poder democrático, sobre o qual não pairam superiores, nem aqui nem alhures; e, mais, o REFERENDO  constitui-se democracia direta, sem quaisquer mediações da representação política. Esta é a razão mediante a qual a decisão expressa de um REFERENDO é auto aplicável, é vinculativa, sendo, por conseguinte, descabido o veto da Presidente Dilma Roussef. A Presidente Dilma Roussef não dispõe de autoridade constitucional e legal para vetar uma decisão de cidadania direta; seu veto riscou da Constituição Brasileira o instituto do REFERENDO, uma atitude sem pararalelo na trajetória da democracia mundial. Nem mesmo ditadores sanguinários como Salazar em Portugal atreveram-se a tanto.

Com o desrespeito de sua decisão livre e democrática, os cidadãos do Acre foram considerados pela Presidente Dilma Roussef cidadãos párias, de segunda classe, de categoria inferior, epítetos merecedores da mais veemente repulsa pelos acreanos.

Pode-se aduzir, por fim, que corrigir o desrespeito grotesco à vontade dos cidadãos do Acre não interessa apenas aos acreanos; interessa ao Brasil, é essencial à democracia, no sentido de impedir a retirada da Constituição Federal do instituto democrático do REFERENDO.

Por esta razão, estou em greve de fome, em frente ao Palácio do Planalto, há vinte e dois dias, hoje, 22 de maio de 2013. E vou continuá-la por mais tempo.