E se casar for abrir os olhos e fechar a boca?

– Como tá rapaz? Quanto tempo, Alfredo! E aí quais são as novas?

– Diga lá meu velho! Nossa! Nem lembro a última vez que nos encontramos.  Faz tempo né? Como estão os filhos, César?

– Estão bem. Tudo certo… e você faz o que aqui?

– Vim visitar um amigo meu. E você, que bons ventos o trazem?

– Rapaz, trabalho de cobrador. É uma desgraça. Nunca imaginei que no mundo tivesse tanto caloteiro. Oh povinho pra gostar de dar tombo nos outros!

-Verdade.

– Mas me diz, ainda está casado com a Leyla?

– Estou sim. Mas estamos em crise. Meu casamento está uma merda!

– Puxa! Sério? Mas vocês se mostravam um par tão perfeito! Eu imaginava que tinham nascido um para o outro.

– É, podemos ter nascido um para o outro, mas não estamos vivendo assim.

– Não entendi! Explica. Se isso não lhe trouxer algum constrangimento. Se não quiser falar, não fala tá! Desculpa minha indiscrição.

– Nada! Relaxa! Na tem problema não. Eu não tenho o que esconder. Minha mulher tá uma bola de futebol para baleias.

Antes ela se cuidava, mas depois dos dois filhos, relaxou e hoje só pensa em comer. Engordou de um jeito que não sinto mais nenhum prazer nela.

A cama, à noite, é um terror. Quando ela se assanha, querendo alguma coisa, eu fico logo com medo de que o leito não suporte e venha ao chão. Naquele peso, qual cama aguenta um remelexo mais forte.

– Nossa Alfredo, você também é exagerado. Para com isso. O Roberto já dizia: “quem foi que disse que tem que ser magra para ser formosa”. Normal isso. É o tempo. Deixa de besteira.

– Besteira, besteira! Duvido se o Rei fica com gorda. Essa música é daquelas faço o que eu digo, mas não faça o que eu faço. Roberto Carlos nunca foi visto com um bujão. E tu falas assim porque não é contigo. Vai encarar a fera, pra tu veres se tu não corres o sério risco de ser esmagado.

Não sinto mais prazer. Beleza não é tudo, mas a imagem pesa na hora de termos sensações mais provocantes. Com todo aquele peso, não dá para querer mais que o sono breve.

– Ela tá pesando quanto? Vamos ver o teu exagero.

– Sei não. Pesá-la não é fácil. Acho que só nos portos de Amsterdã, na Holanda, deve ter balança que consiga um feito desse. Se ela prosseguir com essa forma, o piso lá de casa terá de ser trocado a cada semana.

– Meu deus! Que homem exagerado. Eu vi sua esposa mês passado lá perto do Terminal. Nem está tão gorda assim. Para com isso. Você pode machucar os sentimentos dela.

– Sério? Você a viu? Nossa! Então posso imaginar que aconteceu um super congestionamento no centro da cidade. Cada vez que ela ia atravessar uma rua, os carros esperavam mais de dez horas.

– Você não tem jeito! Opa! Lá vem meu devedor. Tchau Alfredo! Manda um abraço pra tua mulher e vê se não somem não tá!

– Um abraço nela, só se eu fosse um povo gigante. E sumir, só quem pode sou eu. Ela, não tem como.

– Falou amigão!

– Senhor Alfredo de Lima Cruz. É o senhor? Por favor, me acompanhe. A sala fica na segunda porta após o corredor. Trouxe os exames?

– Sim senhora! Aqui estão!

– Ótimo! Acompanhem-me.

– E então doutor! O que o senhor tem a dizer?

– Alfredo seu quadro exige cuidado! Eu já tinha lhe falado no mês passado que você precisa cortar certos tipos de alimentos. Você precisa abandonar essa vida de sedentarismo.

– Doutor, eu não consigo! Tento, tento, mas não tem jeito.

– Como não tem jeito? Olha essa pressão! Olha esses exames? Você já passou dos cento e vinte quilos. Lamento dizer, mas você é uma bomba relógio. Se não liga pra estética, pra imagem, deveria ao menos cuidar de sua saúde.

– Sim doutor! Eu sei! Estética, imagem, forma física, pra mim isso não tem valor algum. Estou aqui por causa de minha saúde. Preciso cuidar mais de mim.

Por FRANCISCO RODRIGUES PEDROSA    f-r-p@bol.com.br