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Relator do mensalão retoma voto sobre fraudes no Banco Rural

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Na abertura do segundo mês de julgamento do processo do mensalão, o  relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, retoma nesta segunda-feira (3) seu voto sobre os supostos crimes cometidos por quatro executivos do Banco Rural.


O magistrado começou a analisar na quinta (30) as acusações de gestão fraudulenta contra a ex-presidente da instituição financeira Kátia Rabello, os ex-vice-presidentes José Roberto Salgado e Ayanna Tenório e o ex-diretor Vinicius Samarane.


Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os antigos dirigentes do banco mineiro teriam simulado empréstimos paras abastecer o ‘valerioduto’ (suposto esquema operado por Marcos Valério para alimentar o mensalão). Para os integrantes do Ministério Público, o Banco Rural teria repassado R$ 32 milhões para financiar o pagamento de propinas a parlamentares da base aliada em troca de apoio na aprovação de projetos de interesse do governo do ex-presidente Lula (2003-2010).


Ao ler as primeiras 66 páginas de seu voto, Barbosa enfatizou que os quatro réus não observaram as regras previstas pelo Banco Central ao concederem financiamentos para o PT e para as agências de Marcos Valério.


O relator iniciou sua análise sobre o item 5 da denúncia da PGR, que trata do chamado “núcleo financeiro”, mas a sessão foi interrompida antes da conclusão para uma homenagem ao ministro Cezar Peluso, que se aposentou na última sexta (31). Barbosa deve concluir sua argumentação nesta segunda. Se ele encerrar seu voto até o intervalo reservado para o lanche, é possível que o revisor da ação penal, ministro Ricardo Lewandowski, deflagre sua manifestação na segunda etapa da sessão.


Barbosa sustentou na quinta-feira que os valores emprestados pelo Banco Rural ao PT e às agências de Valério não foram pagos.


“Senhores ministros, à luz de todo o acervo probatório que veio à tona, verifica-se que, na realidade, como bem ressalta a acusação, o Banco Rural só cobrou os valores dos empréstimos após o escândalo do mensalão e assim agiu porque os empréstimos não eram para serem pagos. Essa afirmação de que os valores milionários somente foram cobrados após o mensalão foi comprovada pela própria Kátia Rabello”, observou o magistrado.


A PGR pediu a condenação dos quatro acusados ligados ao Banco Rural por gestão fraudulenta, violação prevista na lei de crimes contra o sistema financeiro. A pena para a irregularidade oscila de três a 12 anos de detenção.


Na quinta, em meio à leitura do voto do relator, a defesa dos réus do núcleo financeiro questionou o enquadramento penal invocado pelo Ministério Público para denunciar os dirigentes da instituição financeira de Minas Gerais.


Para o ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos, advogado de José Roberto Salgado, os procuradores da República não conseguiram “comprovar” que os antigos diretores cometeram fraudes à frente do banco. Além disso, o defensor reclama que, em sua manifestação, Barbosa não teria descrito crimes de gestão fraudulenta, e sim de “gestão temerária”.


Embora também seja uma ilegalidade, a administração temerária é uma violação penal de menor relevância. Ao contrário da gestão fraudulenta, que pressupõe a ocorrência de fraude, a temerária indica que os executivos teriam, apenas, assumido riscos excessivos no comando da instituição financeira.


“Ele (Barbosa) não falou de fraude, embora o capítulo fale de gestão fraudulenta. Precisa avaliar isso (o enquadramento do crime) de uma maneira correta e sensata. Esperamos que o colegiado faça isso. Gestão fraudulenta é mais grave, envolve fraude. Já a temerária é descumprimento e negligência”, ponderou Thomaz Bastos durante a última sessão do julgamento.


À frente da defesa da ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello, o advogado José Carlos Dias também argumenta que o relator da ação penal descreveu na primeira parte de seu voto sobre o núcleo financeiro as características de uma gestão temerária. Dias, que comandou o Ministério da Justiça no governo Fernando Henrique Cardozo (1995-2002), disse na última semana que pretende entregar um novo memorial (esclarecimentos da defesa) aos magistrados para ressaltar a suposta falha de enquadramento penal.


“Se houve falha no contrato, falta de observação, isso não redunda na afirmação de uma fraude no emprestimo”, destacou o advogado.


Empréstimos fictícios


De acordo com o Ministério Público, Kátia Rabello e José Roberto Salgado autorizaram os empréstimos fictícios. Ayanna Tenório teria autorizado renovação de empréstimos e Vinícius Samarane teria omitido saques feitos em agências do banco.


A defesa de Kátia Rabello nega a suposta concessão de empréstimos simulados. O advogado de José Roberto Salgado, Marcio Thomaz Bastos, viu uma “construção mental”na acusação. Já a defesa de Vinícius Samarane disse que todos os saques realizados foram notificados ao Banco Central.


O ministro-relator, Joaquim Barbosa, afirmou que empréstimo ao PT foi liberado pela instituição sem que fossem registrados dados obrigatórios sobre o partido.


“O empréstimo ao Partido dos Trabalhadores foi liberado sem que tivesse sequer cadastro do partido, cadastro das pessoas físicas e cadastro dos avalistas. […] Digo eu, tais fatos dão pleno suporte à afirmação da acusação de que ‘os cadastros existentes sequer eram atualizados, estavam instruídos com informações falsas e quando apareciam insuficiências eram ignoradas pelo Banco Rural’.”


O relator destacou ainda que o Banco Rural concedeu R$ 10 milhões à empresa Graffiti, de Marcos Valério, sem ter informações suficientes sobre as condições financeiras da agência.


“O Banco Rural não detinha informações econômicas suficientes que ancoravam o empréstimo de R$ 10 milhões e nem para outro empréstimo para a DNA, de R$ 21 milhões. Isto fica evidente em parecer técnico, emitido por analistas”, disse.


Joaquim Barbosa leu, inclusive, laudos periciais que indicam que agências de Marcos Valério forneceram informações falsas para tomar empréstimos. Os dados prestados ocultam, de acordo com a perícia, dívidas milionárias das empresas.


“Agrava-se a situação do Banco Rural o fato de haver toda uma análise financeira com base em informações falsas que ele tinha condições de saber que eram inidôneas. O Banco Rural descumpria conscientemente normativos de combate à lavagem de dinheiro do Banco Central”, reiterou o ministro.


Renovação de empréstimos
Outra questão apontava pelo relator foi a renovação de empréstimos concedidos apesar de parecer contrário de analistas da própria instituição financeira.


“Em flagrante descumprimento desses preceitos normativos, os então principais dirigentes do Banco Rural procederam a arrolagem de dívidas com incorporação de encargos. Realizavam estornos relativos a encargos financeiros devidos em virtude de atrasos e mantiveram a mesma classificação de risco [prevista inicialmente no contrato]”, afirmou.


Nota do Banco Rural
O Banco Rural divulgou nota na última quinta-feira (30) afirmando que os empréstimos concedidos pela instituição foram declarados “verdadeiros” por perícia da Polícia Federal.


“Os empréstimos concedidos às empresas de Marcos Valério foram periciados pela Polícia Federal por solicitação do Ministro Joaquim Barbosa e considerados verdadeiros. O valor global dos empréstimos era proporcional à capacidade dos tomadores e correspondiam a menos de 1% da carteira do Rural em 2003”, afirma o banco.


Na nota, a instituição financeira diz ainda que,  em 14 de janeiro de 2005, antes da “eclosão do mensalão”, o banco se recusou a renovar empréstimos das empresas Graffite e SMP&B, ambas de Marcos Valério.


“Os empréstimos ao PT e a Marcos Valério não foram concedidos originalmente por nenhum dos executivos acusados na Ação Penal 470. Os ex-dirigentes não concederam os referidos empréstimos, limitando-se a participar pontualmente de alguns processos de renovação que não implicaram o desembolso de recursos novos pelo banco e que inseriam-se na estratégia adotada pela nova administração do Rural para garantir o pagamento dos créditos”, afirma ainda o Banco Rural na nota. (G1)


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