Os 35 haitianos que aguardam em Brasileia (AC) a regularização, pela Polícia Federal, de seus documentos para poderem trabalhar no Brasil, vivem situação bem melhor que os 96 compatriotas em Iñapari, província peruana. A cidade do Peru é separada do Brasil pelo Rio Acre e faz divisa com a brasileira Assis Brasil e a boliviana Bolpebra.
Esses haitianos vieram para Brasileia ao constatar que em Iñapari não teriam a menor chance de ingresso no Brasil e viveriam situação semelhante ao de seu país de origem. O representante do governo do Acre no município, Damião Borges de Melo, os abrigou na antiga sede da Secretaria de Educação de Brasileia, onde os estrangeiros se dividem em cinco cômodos e têm dois banheiros à disposição.
A cada dois dias, um caminhão pipa da prefeitura abastece a caixa d’água da casa com 7 mil litros que servem para o banho e lavagem de roupa. Também são servidas três refeições por dia: pão com manteiga e café com leite no café da manhã e, geralmente, arroz, feijão, macarrão, frango e carne bovina no almoço e jantar.
No entanto, problemas semelhantes aos que ocorrem em Inãpari com os 96 haitianos no Peru também são registrados em Brasileia, especialmente, o lixo jogado no quintal, como pratos de alimentos, roupas garrafas pet, entre outros.
O haitiano Obelca Jules, 30 anos e pedreiro por profissão, disse à Agência Brasil que veio para o Brasil em busca de trabalho, como todos os demais do grupo. Obelca chegou com esposa e outros seis parentes depois de passar por Iñapari e constatar que não teria condições de ficar na cidade.
“Quando chegamos em Iñapari vimos que não dava para ficar. No Peru a situação está muito difícil”, disse o haitiano. De lá, eles retornaram à Ibéria, cidade peruana de 7 mil habitantes, pegaram uma trilha de oito quilômetros de selva amazônica até um quartel da Marinha da Bolívia e seguiram de carro até Cobija, que faz fronteira com Brasileia por duas pontes.
Apesar do atendimento no Brasil, os haitianos reclamam do tempero da comida, diferente da que estão acostumados no Haiti. Vil Saint Clenord, 26 anos, eletricista, disse que “muitos [haitianos] não estão acostumados com a comida e não comem com apetite” os 72 pratos servidos diariamente ao custo de R$ 370 por dia.
Essa diferença cultural de culinária já levou ao hospital de Brasileia algumas pessoas, admite Clenord. “Nós somos atendidos com dor na barriga, mas o médico não passa nada. Ele diz que nós não temos nada”, disse .
Outra diferença que chamou a atenção foi a diferença de receptividade entre a comunidade de Brasileia e a de Iñapari. Os peruanos reclamam muito de “badernas” provocadas pelo grupo que está lá.
Em Brasileia a situação é totalmente oposta. A pasteleira Ercília Lima Barroso, vizinha de muro da casa onde estão os haitianos já se acostumou e fez amizade com eles. “Eles não dão problema. Ontem à noite, dois deles estiveram na minha casa para pedir água. Eles são muito educados”.
No entanto, tem gente do bairro Ferreira da Silva, onde estão os haitianos, que reclama do dinheiro destinado pelo governo do Acre para essas pessoas. Segundo Ercília, esse grupo é minoria e defende que o dinheiro teria que ser aplicado em investimentos na cidade.
“Eu não concordo. Se o terremoto que acabou com Haiti tivesse acontecido aqui no Brasil e a gente tivesse que ir para outro país, será que gostaríamos de ser maltratados? Claro que não. Sem o terremoto eles ainda estariam lá, não viriam para o Brasil”, defende a pasteleira.
Sua irmã, que ajuda na lanchonete e também mora no bairro, também defende que os haitianos devem receber ajuda. Segundo ela, da leva de 2,7 mil haitianos que imigraram para a cidade e tiveram a situação regularizada pelo governo brasileiro, dois casaram com mulheres de Brasileia.
“Eles dizem que gostam de loiras e casaram com duas vizinhas minhas, uma de 40 anos e outra de 35”, disse Auxiliadora. Ela disse que os haitianos frequentavam todas as noites a pastelaria e até jogavam dominós com elas.
Agencia Brasil
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