Categories: Crônicas de um Francisco

Adele da Cruz

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Roberto Vaz

Sou uma pessoa estranha! Meus melhores amigos dizem! A santa que me jogou nesse mundo confirma! As mulheres que estiveram comigo descobriram!  Não posso duvidar mais disso.


Dos seis irmãos de Dona Letícia, a mais velha herdou as maiores qualidades. Sempre foi a mais talentosa, a mais dinâmica, tinha um dom por demais incomum para o resto do mundo e para o resto dos irmãos.


Poliglota, criativa, intrépida, sensível e com um coração enorme, Marta tinha a capacidade de fazer de um escorpião um grande massagista. Aos cinco restantes, nada restava que satelitizar tanto brilho, pois tínhamos a ligeira impressão que nesse barco era ela a comandante.


Marta, saudade de você minha irmã! Obrigado pela referência na vida, nas coisas e principalmente na música. É disso que gostaria de falar, depois que ousei ouvir algumas rádios, enquanto agonizava no nosso trânsito.


Meu gosto musical é uma herança dela. Ouvi Legião Urbana, Roberto, Titãs, Caetano, balada americana e tantos outros artistas que marcaram a divina década de 80. Graças a ela, sempre fui muito desconfiado com canções e cantores que me perguntavam cadê o grito das gatinhas, bem como com os que me convidavam a sair do chão.


Hoje, tanto tempo longe dela, observo os fenômenos musicais do Brasil com repúdio. Meu Deus, quanta porcaria! Rituais sinistros, rimas bizarras, conjugações tontas, repertórios pobres, vazios, belos diplomas de imbecilidades. As musicas brasileiras, hoje, me parecem, com algumas poucas exceções, um retorno ao submundo do lixo.


As letras são porras loucas. Por carência de massa cefálica, se quer, criam discursos coerentes. Ninguém sabe mais onde estão as palavras, os verbos, os argumentos. Meteram na ou no… só pode!


Olhem essa merda: Eu quero tchu, eu quero tcha Eu quero tchu tcha tcha tchu tchu tcha  Tchu tcha tcha tchu tchu tcha. O ritmo é gostoso, o corpo se mexe inconsciente, mas não dava de dizer o que realmente quer. Quer fazer sexo? Quer ficar com a menina? Fala pô! Quem é que se aproxima de alguém e mostra suas intenções dessa forma. Se há, é doido e se aparecer lá pela rua de casa, podem matar que é bicho.


Eu gastaria mil páginas com mais exemplos dessa onomatopéia musical, mas já basta. Temos luz no fim do túnel. Felizmente uma luz que vem do outro lado do Atlântico, longe dos rumores de um país tropical que, de tanto sofrer com seu destino, aprendeu a descer até o chão. Seu nome é Adele, mais precisamente Adele Laurie Blue Adkins. Uma jóia nascida em Enfield, cinco de maio de 1988.


Essa moça canta com a alma. Expressa-se com lágrimas nos olhos. Para falar de sofrimento não cria “dancinhas”. Para falar de dor no coração, não mostra a bunda. Para expor momentos a dois, não faz gestos obscenos. Não banaliza o sexo, não vulgariza o contato, não avacalha com o orgasmo.


Adele é mágica. Ao vê-la em sua performance , congelo, pairo no ar. Meus olhos brilham tanto quanto os das mulheres ao verem o sapato novo na vitrine.


Adele é charme. Tem pureza quando destaca seu inglês compassado e calmo. É uma placa na estrada dizendo podemos viver nossos amores sem cocaína no nariz. Podemos admirar uma pessoa sem maconha no pulmão. Podemos nos declarar para alguém sem os efeitos do álcool que corrói.


Enquanto isso, aqui no Brasil:


1)    “Tche Tche Rere Tche Tche RereTche Tche RereTche Tche RereTche Tche Tche Tche”,


2)    “O Rebolation, tion. O Rebolation.  O Rebolation, tion, Rebolation.  O Rebolation, tion. O Rebolation.  O Rebolation, tion, Rebolation”,


3)   Créu-Créu-Créu-Créu Créu-Créu-Créu-Créu…(6x) Hahahahaha Créu-Créu-Créu-Créu Créu-Créu-Créu-Créu…(8x)!


4)   tô doidinha pra te dar da da da da da da da da da tô doidinha pra te darda da da da da da da da da tô doidinha pra te dar


5)   Vem neném, neném vem neném neném vem neném neném vem Vem neném, neném vem neném neném vem neném neném vem


6)   Eu to na rádio, eu to na metropolitana Eu to na rádio, eu to na metropolitana (uhl) Eu to na rádio, eu to na metropolitana E a minha rádio é a metropolitana (vai)


7)   O jumento e o cavalinho Eles nunca andam só Quando sai pra passear Levam a égua Pocotó Pocotó pocotó pocotó pocotó Minha egüinha Pocotó


Vendo esses sete exemplos de pecados musicais, imagino como é bom estar com alguém que queremos, abraçar forte, sorrir, beijar a boca e ouvir as cantigas dessa inglesinha dizendo: “This is how the story went. I met someone by accident that blew me away, blew me away”.


Adele, doce menina, bem vinda! Permaneça! Pelo amor de Deus, permaneça! Meu amor por você vem desde os tempos em que cantava nos pubs de Londres e ensaiava versos anônimos.


Perdoe-me dizer, mas quando nos alerta:“Never mind, I’ll find someone like you”, vendo as “musiquetas capengas” brasileiras, com seus vômitos, flatulências e arrotos que escapam de bocas vulgares, tenho sérias dúvidas se eu encontrarei alguém igual a você.


Obrigado Marta! Fez-me raio, relâmpago e trovão.


Obrigado Adele. Fez-me romantizar até mesmo os fracassos.


Uma me ensinou a ser estranho, um metal contra as nuvens. A outra me ensinou a gostar de não ser normal, ter de ficar em pé com os meus próprios pés.


When the thunder calls for me Next time I’ll be braver I’ll be my own savior. Standing on my own two feet (Adele)


 


FRANCISCO RODRIGUES     f-r-p@bol.com.br


 


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Roberto Vaz

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