Quero abordar nesse espaço dois assuntos de extrema relevância em discussão no Congresso Nacional. São temas que refletem diretamente o futuro que queremos para o Brasil e o povo brasileiro. Trata-se de duas propostas que se referem às áreas de ciência, tecnologia, pesquisa e inovação. Uma delas é o PL 2177/2011, que cria um Novo Código para a Ciência Brasileira; a outra, a aprovação do PL 448/11, que trata da distribuição dos royalties do pré-sal, pelo Senado Federal, em outubro último.
A idéia de uma mudança na legislação brasileira sobre o tema surgiu em audiência pública realizada pela Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, no final de abril deste ano. A partir dos relatos do Ministro de Ciência e Tecnologia, Aloísio Mercadante, referentes aos entraves para desenvolvimento da pesquisa e inovação, ficou claro que o Brasil só recuperaria o tempo perdido e disputaria seu lugar entre os países desenvolvidos a partir de investimentos estruturais na área. Foi pensado, então, alternativas para a solução dos problemas elencados pelo Ministro. A partir de um encontro com os Secretários de Estado de Ciência e Tecnologia de todo o país, realizado no final de maio em Belo Horizonte, convoquei uma reunião com representantes de várias instituições de pesquisa brasileira. Estava instituído o Grupo de Trabalho, criado com a missão de elaborar uma proposta legislativa que tentasse refletir os principais problemas da pesquisa no Brasil, apontando soluções e com capacidade de oferecer maior segurança e condições de trabalho para os operadores da ciência.
Formado o GT, as discussões se deram sobre os grandes problemas enfrentados pelo setor, tais como: a Lei de Licitações, subvenções, financiamentos, compras no exterior, entre outros. Durante três meses o debate recebeu contribuições de mais de 1.200 entidades públicas e privadas de todo o País. Pela proposição, defendemos um novo olhar da lei sobre temas como as licitações, aquisição e contratação, prazos, dentre tantos outros.
Queremos que a legislação brasileira estabeleça um regime diferenciado quando o assunto é ciência, tecnologia e inovação. Que todo aporte de capital nestas ações, sejam considerados investimento. Mas é importante esclarecer que não há oposição à fiscalização rigorosa, à transparência na aplicação dos recursos. Todos esses cuidados foram adotados na nova proposta legislativa.
Sobre as pesquisas por empresas privadas, a exemplo do que já se pratica nos países desenvolvidos, abre-se a possibilidade de incentivo e fomento público a empresas atuantes em pesquisas de CT&I, para constituição de parcerias e criação de incubadoras. Dessa forma, criam-se instrumentos de estímulo à inovação como as subvenções econômicas, financiamentos, participação societárias e o voucher tecnológico, que é um crédito não reembolsável concedido pelas agências ou órgãos de fomento.
Para as importações de equipamentos, o PL defende que as instituições de pesquisa possam adotar os procedimentos do Programa “Importa Fácil”. Onde o tratamento aduaneiro é simplificado e tem maior agilidade, e conta com uma equipe especializada da Receita Federal com treinamento para despacho de cargas relativas a produtos destinados à pesquisa e determinação de aeroportos específicos para internacionalização dessas compras realizadas no exterior.
Em relação à prestação de contas, o projeto estabelece que a União, Estados, DF e os Municípios deverão adotar sistemas de prestação de contas flexíveis com obediência aos seguintes princípios: foco na análise do resultado do projeto e não na contabilidade, limite para remanejamento com justificativa posterior e prestação de contas mediante relatório eletrônico, com obrigação de guarda dos documentos comprobatórios do bom uso dos recursos, a exemplo do que é hoje a Declaração do Imposto de Renda.
Outro ponto importante que não ficou esquecido pela proposição diz respeito à dedicação exclusiva. Pela proposta, os professores de dedicação exclusiva poderão realizar atividades de pesquisa e extensão em horário concomitante, sem prejuízo das vantagens do cargo público, fazendo jus ao recebimento de bolsa de incentivo à inovação, se for o caso. Além disso, permite que os pesquisadores estrangeiros, detentores de visto provisório de permanência no Brasil, possam atuar em projetos de ciência tecnologia e inovação, recebendo bolsas de qualquer natureza. Em rápidas pinceladas, essas são algumas mudanças a que se propõe o PL 2177, cujo estágio de tramitação atual é a formação de uma Comissão Especial para estudo do tema.
Referente ao PL 448/11, aprovado pelo Senado Federal em outubro, destaco a forma de distribuição dos royalties do petróleo para a área. Não houve por parte dos parlamentares daquela Casa, sensibilidade suficiente para entender que este pleito visa proteger as futuras gerações da nação brasileira, que clama por mais acesso ao conhecimento – algo que só poderá ser alcançado com educação de qualidade embasada na apropriação da capacidade de gerar avanços científicos e tecnológicos. Diante disso, meu temor é de que possamos repetir o mesmo cenário venezuelano de décadas passadas, ou seja, não conseguirmos aliar os recursos provenientes das divisas do petróleo com o desenvolvimento que queremos. Sobre isto, recomendo a leitura do inesquecível economista Celso Furtado, que, em viagens de estudos àquele país, produziu o livro “Ensaios sobre a Venezuela: subdesenvolvimento com abundância de divisas”.
E o Projeto, que foi aprovado sem levar em conta as reivindicações da SBPC e da ABC, que defendem 30% dos repasses dos recursos para a Educação e 7% para a pesquisa, tem mais um agravante. Se não modificado na Câmara, teremos o fim da destinação de parte dos royalties do petróleo para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). A ironia desta omissão é que o pré-sal só pode ser descoberto porque o Brasil (Petrobras, institutos de pesquisa e universidades) investiu em ciência, tecnologia e inovação. A omissão de hoje, certamente, impedirá que novas descobertas possam alavancar o Brasil do futuro.
Os recursos do pré-sal devem chegar a todos os brasileiros e a melhor forma é pela educação, um bem duradouro. A melhor maneira de assegurarmos essa herança para as gerações futuras é colocando o Brasil entre as nações mais desenvolvidas, posição que será alcançada também pelos investimentos que formos capazes de fazer em ciência, tecnologia, pesquisa e inovação. Esse cenário será vislumbrado apenas com investimentos contínuos garantidos por projetos de Estado e não de governo. A pulverização de recursos certamente não levará aos avanços sociais e econômicos desejados por todos.
Sibá Machado, Deputado Federal (PT/AC)
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