Estimativas oficiais mostram que o déficit do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), sistema público de previdência que atende aos trabalhadores do setor privado deverá aumentar substancialmente nos próximos 45 anos mesmo sem as alterações no chamado fator previdenciário – aprovadas nesta quarta-feira (13) pela Câmara dos Deputados.
Com as mudanças, a trajetória do rombo da Previdência Social tende a ficar maior ainda, de acordo com especialistas consultados pelo G1. A aprovação que aconteceu nesta semana na Câmara dos Deputados ainda é o primeiro passo. Para que tenha validade, a Câmara ainda precisa concluir a votação das demais sugestões de alteração da Medida Provisória 664. Após a aprovação da redação final, o texto seguirá para o Senado. Por fim, ainda teria de ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff, que tem poder de veto.
Segundo o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2016, enviado no mês passado pelo governo ao Congresso Nacional, o déficit do INSS, estimado em R$ 66,7 bilhões para 2015, ou 1,14% do Produto Interno Bruto (PIB), deverá avançar, mesmo sem a mudança das regras do fator previdenciário, para R$ 1,04 trilhão em 2040 (3,52% do PIB) e para R$ 7,21 trilhões em 2060 – o equivalente a 9,24% do PIB, estimado em R$ 78 trilhões. Essa projeção foi feita pelos Ministérios da Previdência Social, da Fazenda e, também, do Planejamento.
Parâmetros utilizados
Para se fazer a estimativa do déficit do INSS, o governo informou que foram considerados os parâmetros de queda do PIB de 0,9% neste ano e de uma alta de 1,3% em 2016, de 1,9% em 2017 e de 2,4% em 2018.
“A partir de 2019, a taxa de crescimento do PIB se iguala ao crescimento da massa salarial determinada pelos modelos demográfico e do mercado de trabalho, explicado nas seções anteriores. Além disso, também foi considerado um crescimento da produtividade média de 2,5% ao ano”, informou o governo no exercício.
As projeções de despesa foram realizadas considerando os efeitos da Medida Provisória 664 que alteraram as regras de concessão de pensões por morte e de auxílio-doença, mas não as mudanças do fator previdencário – aprovadas na mesma MP.
“Como a Medida Provisória ainda está em discussão no Congresso Nacional, qualquer alteração nas regras nela estabelecidas alterarão os resultados das projeções aqui apresentadas”, acrescentou.
Equipe econômica não se pronuncia
O G1 entrou em contato com os Ministérios da Previdência, da Fazenda e do Planejamento para saber se a equipe econômica vai endossar as alterações feitas pela Câmara dos Deputados e qual seria o seu impacto nas contas públicas. Entretanto, até a última atualização desta reportagem, somente o Ministério da Previdência enviou resposta. Se limitou, porém, a informar que só iria se pronunciar ao fim da tramitação do projeto no Congresso Nacional.
Analistas calculam impacto
Ouvidos pelo G1, economistas que trabalham com as contas públicas avaliaram que as mudanças, se confirmadas pelo Congresso Nacional, teriam efeito negativo no crescente déficit da Previdência Social – com impacto potencial de 0,5 ponto a 1 ponto percentual do PIB em 2040 – e também enviaria sinalizações negativas para investidores e agências de classificação de risco sobre a sustentabilidade do sistema previdenciário brasileiro.
“Isso é mais lenha na fogueira de uma trajetória do crescimento do gasto do INSS que já não é sustentável, dada essa mudança demográfica em curso. Para as próximas duas décadas e meia, já é uma trajetória que não é sustentável. No curto prazo [próximos anos], o efeito é positivo porque várias pessoas vão adiar a aposentadoria para se adequar à regra”, avaliou o economista Mansueto Almeida – que calculou um impacto de alta do déficit do INSS de 0,8 ponto a 1 ponto percentual do PIB em 2040 com as alterações no fator previdenciário.
Para ele, essa mudança no fator previdenciário englobaria 30% dos trabalhadores – aqueles que se aposentam por tempo de contribuição. “Já gastamos atualmente 13% do PIB com os sistemas público e privado de previdência, e também com a Loas [Lei Orgânica de Assistência Social]. É o que gasta um país que tem a proporção de pessoas com mais de 60 ano que é o triplo da nossa”, disse Mansueto.
Para o economista, o Brasil estaria indo, com esta mudança, na direção contrária de vários países do mundo, que estão endurecendo suas regras para promover uma maior sustentabilidade do sistema previdenciário. “No médio e longo prazos, isso só se sustenta com mais carga tributária [aumento de tributos]. E a carga já é alta no Brasil. A sinalização não é boa”, concluiu.
Para Raul Velloso, economista que foca sua análise em contas públicas, o efeito da mudança seria de 0,5 ponto percentual do PIB em 2040. “O pior não é tanto o impacto financeiro, mas é porque mutila aquela que foi a principal mudança nas últimas reformas que fizemos, que foi a introdução do fator previdenciário. Mutilou o fator. É mais um efeito sobre o sistema”, declarou ele.
De acordo com Velloso, os gastos com previdência e assisência social dobrariam em 50 anos mesmo sem as alterações do fator previdenciário, na porcentagem com o PIB. Passariam de 11% do PIB para 22% do PIB. “Se tiver um impacto a mais [por conta da alteração das regras do fator previdenciário], torna menos sustentável ainda”, avaliou ele.
Alterações no fator aprovadas pela Câmara
Atualmente, o fator previdenciário reduz o valor do benefício de quem se aposenta por tempo de contribuição antes de atingir 65 anos (nos casos de homens) ou 60 (mulheres). O tempo mínimo de contribuição para aposentadoria é de 35 anos para homens e de 30 para mulheres.
A alteração aprovada propõe a chamada fórmula 85/95, pela qual o trabalhador se aposenta com proventos integrais (com base no teto da Previdência, atualmente R$ 4.663,75) se a soma da idade e do tempo de contribuição resultar 85 (mulheres) ou 95 (homens).
Para professoras, de acordo com a emenda, a soma deve ser 80 e para professores, 90. Se o trabalhador decidir se aposentar antes, a emenda estabelece que a aposentadoria continua sendo reduzida por meio do fator previdenciário.